Olá, meu nome é Eder, tenho 33 anos (fiz 33 hoje, antes mesmo de Jesus, que é de Capricórnio), trabalho como professor universitário na área de língua portuguesa e também como supervisor administrativo em um hospital infantil. Pois é, eu sei que isso não faz muito sentido.
Quando criança, eu tinha plena convicção que me tornaria bombeiro. Na adolescência mudei um pouco de ideia, pois estava muito na cara que eu me tornaria um escritor de muito sucesso que venderia tantos livros quanto o Stephen King.
Não lembro exatamente quando e como as coisas saíram do planejado, se a falta de talento ficou assim tão evidente, só lembro que conforme fui envelhecendo, algumas certezas foram se solidificando dentro de mim e a maior delas é essa: não tenho a mínima ideia do que estou fazendo da minha vida.
Talvez esse alheamento seja o que todo mundo chama de “tocar em frente”, “seguir adiante”, enfim, aquela coisa toda que a gente diz quando não sabe o que dizer.
Às vezes bate uma angústia por causa disso, geralmente ela chega bem na hora em que toca a vinheta do Fantástico domingo à noite. É que não era esse o combinado, sabe? Antigamente o futuro era tão melhor.
Às vezes a gente acha que vai mudar o mundo, mas não muda nem os livros de prateleira. “Por que o Contos Completos do Tolstói tá na prateleira de literatura policial?”, “Sei lá, foda-se, deixa aí, não tá incomodando ninguém”.
Às vezes bate uma angústia por causa disso, geralmente ela chega bem na hora em que toca a vinheta do Fantástico domingo à noite. É que não era esse o combinado, sabe? Antigamente o futuro era tão melhor.
“Por que você deixou a sua vida ser assim tão vazia? Há quantas horas você está assistindo ao Netflix?”, “Sei lá, foda-se, deixa aí, não tá incomodando ninguém”.
Percebi que tirando o supracitado Jesus, que já era bem resolvido antes mesmo de nascer, há um bocado de gente meio perdida por aí. É um pessoal de trinta e poucos anos que conquistou uma coisa ou outra, mas que no fundo não fez grandes bostas da vida e que sente que agora também não dará mais tempo de mudar a história da humanidade, pois logo logo tá na hora de dormir e é preciso acordar cedo etc (somos assim meio ansiosos, do tipo que quer a felicidade agora feito criança birrenta pedindo doce, eu sei. O que eu não sei é se isso é culpa do cinema americano, das propagandas de banco, do Xuxa Park antes do incêndio ou das palestras de autoajuda às quais eventualmente fomos submetidos) .
Enfim, trata-se de um pessoal que não sabe muito bem para onde ir, então resolvi batizá-los de Geração Sem GPS, pois esse nome me pareceu meio engraçadinho e nós, essa geração aí, gostamos de ser engraçadinhos e irônicos, que é uma forma bacana que encontramos pra tentar disfarçar nossas angústias.
A verdade é que bem lá no fundo a gente sente um medo lazarento. Medo de a vida ser só isso. Aquela sensação de “cara, eu não fiz porra nenhuma”. Não me leve a mal, sei que tem um monte de coisas bonitas por aí, um mundo maravilhoso cheio de detalhes poéticos que um Rubem Braga da vida seria capaz de enxergar e nos revelar o seu encanto. Falo daquele sentimento mais cinza que eventualmente preenche o nosso peito de segunda à sexta em horário comercial, não deixando muito espaço pra qualquer cronista nos explicar a grandiosidade da existência que estamos perdendo, pois o boleto vence dia dez e a fatura do cartão chega amanhã.
A Geração Sem GPS é meio ressentida mesmo, pois pra gente a vida é meio que um arco-íris com um pote vazio no final. Parece que a gente perdeu o bonde que ia para um destino fantástico e agora estamos sozinhos numa rua vazia de um lugar muito isolado, sem nada ao redor tipo Curitiba no Carnaval. Dá até para ouvir uns grilos chatos pra caralho.
E eles só ficam quietos quando começa a vinheta do Fantástico.