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Home Crônicas Helena Perdiz

Fast food

porHelena Perdiz
9 de julho de 2015
em Helena Perdiz
A A
"Fast food", crônica de Helena Perdiz.

Imagem: Reprodução.

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O limpador de para-brisa fazia um barulho chato e repetitivo.

– Você não vai falar nada até a gente chegar? Uma palavra?

– Tô bem assim.

– Não interessa se você tá bem, você vai me explicar o que aconteceu.

– Para de me tratar que nem criança, mãe.

– Ana, eu acabei de buscar você na administração do shopping!

– E daí?

– E daí que você tem 30 anos!

Parou no semáforo e bufou.

“E daí que você tem 30 anos!”

– Vai, Ana, desembucha. Quero saber exatamente o que aconteceu.

– Eu só quero chegar em casa, mãe, só isso.

– E eu só vou dar carona até a sua casa se você me der explicações.

– A explicação é a que eu já falei: eu estava com fome.

– Ana, você atacou um segurança!

– Eu não ataquei ninguém.

– Pular nas costas de uma pessoa não é atacar?

– Ele ia jogar a batata frita no lixo! Era minha, eu estava com fome, ele me impediu de comer e ia jogar fora! Eu só tentei pegar de volta o que era meu.

– Ana!

– É verdade!

Deu a seta e entrou à direita.

– Vamos começar do princípio?

– Tá.

– Por que o segurança ia jogar a sua batata frita no lixo?

– Porque ele foi brigar comigo e eu rebati.

– E por que ele foi brigar com você?

– Porque a moça que estava na mesma mesa que eu foi reclamar de mim pra ele.

Buzinou para um pedestre desligado que surgiu no meio da rua.

– Moça? Que moça? Ana, a minha paciência já chegou ao limite. Faz favor! Conta isso direito, desde o começo.

– Foi assim, mãe: eu tive um dia de merda na empresa, de novo, estava verde de fome e merecia comer algo bem gorduroso, certo?

– Certo.

– A Dani me deixou no shopping. Cheguei na praça de alimentação e tinha mais gente ali do que no show dos Rolling Stones em Copacabana. Respirei fundo, xinguei algumas pessoas mentalmente e entrei numa fila enorme. Eu fiquei quase uma hora na fila, mãe. Fast food meu rabo, dava pra ouvir de longe o pedido de socorro do meu estômago.

– Eu ainda não entendi como isso vai chegar na administração do shopping.

– Você pediu do começo, não pediu?

Reduziu para trinta por hora, seguindo atrás de um caminhão.

– Pedi.

– Então. Fiquei mais uma meia hora na outra fila e, finalmente, me chamaram. Olhei pra bandeja: nada a ver com o que eu pedi. Misturaram tudo, ninguém sabia me explicar o que tinha acontecido, me pediram pra esperar num canto. Esperei. Meu estômago chorava sangue.

– Certo, dramática.

– Me chamaram de novo e o pedido estava certo dessa vez. Peguei a bandeja como se fosse um Oscar, cheia de emoção, dei um passo e uma mulher esbarrou em mim e derrubou tudo.

– Meu Deus, Ana!

– Eu tive que voltar lá, explicar a situação e esperar fazerem um novo lanche. Até aí o meu estômago já tinha parado de funcionar porque ele se esqueceu como fazia.

– Tá. E aí?

– Aí eu peguei a nova bandeja depois de tudo isso, comecei a andar e percebi que não tinha onde sentar. Não havia absolutamente nenhum lugar, eu rodei aquela praça inteira e nada. Até que eu vi uma cadeira vaga na mesa de uma família, fui lá e sentei.

Freou.

– O QUE? Você sentou na mesa de uma família desconhecida?

– Qual é o problema? Eu estava prestes a morrer de fome, não aguentava mais, precisava comer. E a cadeira estava vaga, oras.

Voltou a acelerar vagarosamente.

– Mas o que você falou?

– Nada.

– Nada?

– Nada, eu sentei e comecei a comer. Foi um momento de realização.

– Ana! Você perdeu a cabeça de vez!

– Se você tivesse vivido o dia que eu vivi, você também teria perdido, meu bem.

– Então, a mulher desconhecida da mesa que você invadiu simplesmente levantou e foi chamar o segurança?

– Não, primeiro ela me olhou horrorizada, como se eu fosse o Jason, e deu um grito. Aí eu fiz um sinal pedindo pra ela diminuir o tom, porque eu estava com dor de cabeça, né? Porra, não desrespeitei ninguém.

– Eu não consigo acreditar no que estou ouvindo.

– Aí, sim, ela chamou o segurança, ele começou a berrar, eu respondi que estava com fome, ele pegou minha bandeja cheia de batata frita pra jogar no lixo, eu pulei nele, recuperei algumas batatas, ele me algemou e me levou para a administração. Chegando lá, me disseram que eu seria presa.

– E você deu uma carteirada e contou que é filha da proprietária do shopping. Bonito, Ana, bem bonito. Foi essa a educação que eu dei a você e seus irmãos.

– Funcionou, não?

Estacionou.

– Ana, antes de descer…

– Fala logo, mãe.

– Filha, reflita sobre o que aconteceu hoje. Esse trabalho está acabando com você, você está ficando maluca, só trabalha.

– Eu sei.

– Você consegue perceber o que está acontecendo aqui?

– Consigo.

– Então fale alto, coloque pra fora de uma vez: o que está acontecendo aqui?

– Eu ainda estou com fome.

Tags: CopacabanaCrônicaFast foodFomeJasonRolling Stones

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