Um vídeo compartilhado pela polícia de Toronto mostra o exato momento que uma pessoa desconhecida entra tranquilamente na maior exposição já feita com obras de Banksy e simplesmente leva consigo uma das peças. Intitulada “Trolley Hunters” (Caçadores de Carrinhos), a tela foi avaliada em 45 mil dólares canadenses, um pouco mais de 125 mil reais, e compunha a exposição The Art of Banksy, curada pelo seu ex-representante, Steve Lazarides.
Esse roubo tem camadas instigantes de profundidades que vão além do furto de uma obra de arte “convencional”: trata-se de uma tela que critica o capitalismo, feita por um dos artistas de maior renome contemporâneo – e que mantém o anonimato -, exibida em uma exposição não autorizada pelo próprio artista.
Vídeo divulgado pela polícia que flagrou toda a ação do roubo:
No fundo azul e amarelo de um campo, três homens com postura e vestimentas selvagens empunham armas primitivas contra carrinhos de supermercado vazios. “Trolley Hunters” é uma crítica explícita ao capitalismo e, controversamente, vale dezenas de milhares de dólares.
Banksy é multidisciplinar e associa artes gráficas e performance recorrentemente em suas obras, como nas vezes que entrou anonimamente no Tate, Metropolitan ou no Museu de Arte Moderna de Nova York e inseriu obras de sua autoria sem que ninguém notasse. Esses feitos indicam que há uma possibilidade do roubo ter sido orquestrado pelo próprio artista como uma reivindicação de posse, visto que a exposição e a comercialização das obras não foram autorizadas por ele.
Uma vez que uma obra é concebida na urbe, ela é praticamente fagocitada pela cidade e está vulnerável a outras intervenções artísticas, criando palimpsestos eternos e abstraindo o sentido de pertencimento da obra.
Até o momento, essa possível performance não passa de um boato. Mas não foi a primeira vez que uma obra de Banksy foi roubada. O mural “Spy Booth” (A Cabine Espiã) desapareceu em Cheltenham em uma manhã de 2014.
O mural feito na loja Poundland, norte de Londres, foi arrancado e colocado em leilão virtual. A “Sperm Alarm” (Alerta de Sêmen) sumiu do muro de um hotel e nunca mais se ouviu falar e por aí poderia citar dezenas de casos semelhantes.
Uma vez que uma obra é concebida na urbe, ela é praticamente fagocitada pela cidade e está vulnerável a outras intervenções artísticas, criando palimpsestos eternos e abstraindo o sentido de pertencimento da obra.
Mas entre interagir e retirar um graffiti para expor em uma galeria e monetizar em cima disso existe um abismo gigantesco de… ética?
É difícil encontrar palavras que preencham essas reticências. Talvez ética seja a que mais se aproxima se olharmos do ponto de vista artístico, afinal são ações antagônicas ao propósito de Banksy. Após a cisão com seu então representante, Steve Lazaride, em 2009, o artista adotou uma postura “anti-capitalista” mais radical.
Em um ato raro, Banksy concedeu uma entrevista à Village Voice no começo do seu projeto novaiorquino “Better Out Than In”, em outubro de 2013, no qual faz uma autocrítica a comercialização da arte de rua (leia a entrevista na íntegra aqui).
O roubo de obras e a criação de exposições não autorizadas é a antítese do entendimento do próprio Banksy sobre a sua produção: é a incoerência do individual se sobressaindo à liberdade de expressão da rua. The Art of Banksy, que reúne 80 obras nominais, fica em exposição no West End de Toronto até 11 de julho e já faturou, de acordo com a Now Toronto, mais de 1.750.000 dólares apenas com a entrada de visitantes ($35 por pessoa). O conjunto da obra tem valor estimado de 100 milhões de reais.
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