Se o pesquisador norte-americano Henry Jenkins atualizasse seu livro A Cultura da Convergência este ano, certamente haveria um longo capítulo sobre o universo cinematográfico da Marvel (MCU, na sigla em inglês). A estratégia do estúdio, braço da Walt Disney desde 2009, é criar uma narrativa transmídia que se estende por produtos televisivos, filmes e quadrinhos.
Quem vai ao cinema conferir Vingadores – Era de Ultron (2015) sem referências prévias desses outros produtos – se é que isso é possível –, pode ficar perdido. A obra é composta por recortes, oferecendo pouco como estrutura isolada. Conhecer o universo e o material de onde ela se origina enriquece a experiência como espectador.
De que outra maneira seria possível saber que o filme de Joss Whedon está, na verdade, construindo as fundações de pelo menos outros quatro lançamentos no futuro? Enquanto o robô Ultron (James Spader), uma inteligência artificial criada por Tony Stark (Robert Downey Jr.) e Bruce Banner (Mark Ruffalo), planeja destruir a humanidade, o estúdio costura referências e personagens para Pantera Negra (2017), Thor 3: Ragnarok (2017) e Vingadores – Guerra Infinita (lançado em duas partes, em 2018 e 2019).
Quem se sobressai no filme é o vilão Ultron, cujas motivações tem contornos existencialistas e repleta de contradições provocadas por uma sobrecarga de informações acessadas na internet.
A relação mais gritante do longa-metragem é com Capitão América: Guerra Civil, planejado para 2016. Na trama, adaptada da série de hqs homônimas de 2006, Tony Stark e Steve Rogers (Chris Evans) são colocados de lado opostos de um conflito ideológico que separa a comunidade de super-heróis. Aqui, os dois adiantam essa rivalidade em embates físicos e verbais.
Sozinho, Vingadores – Era de Ultron é uma experiência incompleta. Personagens antigos, como Thor (Chris Hemsworth), Viúva Negra (Scarlett Johansson) e Gavião Arqueiro (Jeremy Renner) surgem na tela com dilemas que só funcionam a partir de outros filmes. O mesmo vale para os novatos, como Feiticeira Escarlate (Elizabeth Olsen) e Visão (Paul Betany), que ainda deverão ser melhores trabalhados no futuro.
Sobra para o longa-metragem, ansiosamente aguardado pelos fãs desde que foi anunciado em 2012, Spader como o vilão Ultron. Atuando por meio de captura de movimentos, o personagem age de forma cínica e desequilibrada. Suas ideias lembram as de Rust Cohle (Matthew McConaughey) no seriado True Detective. O homem faz mal ao planeta e aos outros seres vivos, por isso precisa deixar de existir.
Com tanta gente na tela disputando o papel de protagonista, Ultron ganha os melhores momentos da trama. A cena em que sua inteligência artificial é concebida é particularmente bem trabalhada por Whedon, que recria os dilemas existencialistas de uma das antagonistas de Surpreendentes X-Men, hq que roteirizou no início dos anos 2000.
Embora tenha bons momentos, Vingadores – Era de Ultron é uma obra cheia de imperfeições. Como a Marvel Studios está de olho no futuro, as pontas soltas da narrativa podem frustrar quem deseja conferir o filme pelo que é. E essa moda de universos expandidos está se espalhando para outras franquias, como nos super-heróis da DC Comics, na saga Star Wars e na cinessérie Harry Potter. Quem perde é o público, que corre o risco de se isolar nesse tipo de consumo cultural, que requer bastante esforço para ser acompanhado com plenitude.
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