Não é fácil ser fã de musicais. Foi-se o tempo em que o gênero era o queridinho de Hollywood e Amor Sublime Amor, Cantando na Chuva e os filmes de Marilyn Monroe eram a nata da produção cinematográfica. Ao menos no Brasil, onde não temos uma cultura do teatro musical muito forte, existe todo um estigma de que filmes nos quais as pessoas simplesmente “saem cantando” são chatos ou muito desconectados da realidade. Argumento meio falho quando estamos falando de cinema e ficção, mas tudo bem.
Felizmente, na onda de La La Land (e aqui vou propositalmente ignorar aquele breve respiro no início dos anos 2000 proporcionado por Moulin Rouge e Chicago) e de uma geração que cresceu assistindo a High School Musical e Glee, o público está voltando a abrir seu coração para o gênero.
Deve ser por isso que ao assistir a O Rei do Show (The Greatest Showman, no original) eu mantive um sorriso no rosto na maior parte do tempo. E o melhor foi ver que todos que me acompanhavam, não necessariamente fãs de musicais, estavam se divertindo tanto quanto eu.
Os criadores miram claramente em fazer o espectador sentir, sem se preocupar com verossimilhança ou um roteiro que desafie o público. Você sabe como vai acabar desde o início, mas isso não impede que a satisfação esteja lá no final da mesma forma.
No longa, baseado (bem livremente) na história real de P.T. Barnum (Hugh Jackman), um homem sonhador e visionário acaba se tornando o criador não oficial do show business ao abrir o primeiro circo de aberrações no centro de Nova Iorque na primeira metade do século XIX. Seu espetáculo se torna uma sensação, ele rapidamente sobe de status social e novos desafios surgem. Tudo isso permeado com ótimos números musicais e uma história dinâmica que não desacelera em nenhum momento, sendo até um tanto apressada em outros – como na passagem de tempo em que ele enriquece muito subitamente
O filme é grandioso e cheio de músicas que ficam perfeitamente no equilíbrio entre a música pop e as baladas da Broadway. Merece ser visto e ouvido na grande tela. Uma pena que no Brasil tenha passado um tanto batido, já que sua força veio, o que é surpreendente se tratando do gênero, no boca-a-boca dos que viram e gostaram muito. Nos Estados Unidos, onde o gênero é mais popular devido à tradição do teatro musical, o filme agradou público e crítica e a trilha sonora passou semanas no top de álbuns da Billboard e do Spotify americanos. Porém, não apareceu muito nas grandes premiações, o que pode ter afetado sua distribuição internacional.
Sua única indicação ao Oscar 2018 é na categoria de melhor canção original com “This Is Me”, interpretada pela atriz Keala Settle, a mulher-barbada do circo de Barnum. A música pode ser a que tem a mensagem mais poderosa, mas particularmente impressiona mais os grandes números, com todo o coro de artistas junto, como nas músicas “From Now On” e “The Greatest Show”. O dueto entre os personagens de Zac Efron e Zendaya (ambos ex astros adolescentes da Disney, a fábrica de atores-barra-cantores-barra-popstars) é belíssimo, especialmente em sua coreografia, e está entre os pontos altos do filme.
Agora, eu também não gostaria de criar falsas expectativas. Primeiramente, aceitemos que a trama não tem nada de original, já que conta as histórias de um homem que, apesar de não ser ninguém na fila do pão, consegue prosperar na vida, um casal interracial que não pode ficar junto e o preconceito da sociedade com o diferente. Também não é exatamente factível, já que P.T. Barnum, criador do circo que realmente existiu em Nova Iorque, entrou para história mais como um oportunista do que como um herói das minorias.
Dito isso, é cinema. O filme não se propõe a ser uma cinebiografia, mas sim um espetáculo dos mais tradicionais. Os criadores miram claramente em fazer o espectador sentir, sem se preocupar com verossimilhança ou um roteiro que desafie o público. Você sabe como vai acabar desde o início, mas isso não impede que a satisfação esteja lá no final da mesma forma. É brega em alguns momentos? É. Mas isso está quase que intrínseco ao cinema musical. Tudo é exagerado, dramático e empolgante. É o tipo de breguice dos finais felizes que no fundo todos adoramos e aquece o coração. Entretenimento em sua mais pura forma.
O Rei do Show parece ser mais um pequeno, mas inteligente, passo para que o cinema musical volte a ser um gênero abraçado pelo grande público e não só por fãs e preciosistas.
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