Poucas figuras mitológicas foram tão exploradas pelo cinema de horror quanto os vampiros. Eles aparecem desde o início do gênero (como em Nosferatu, F. W. Murnau), em pérolas existencialistas que, de certa maneira, celebram o amor (o belíssimo Amantes Eternos, de Jim Jarmusch) e em obras-primas de grandes diretores (vide Drácula de Bram Stoker, de Francis Ford Coppola).
Mas há também espaço para se pensar sobre os bebedores de sangue em obras menores, não exatamente brilhantes, mas que, com o passar do tempo, se tornaram cult. É aqui que podemos encaixar A Hora do Espanto, filme dirigido em 1985 por Tom Holland (que no futuro se especializaria no terror: é o nome à frente de Chucky – O Boneco Assassino).
Trata-se de um exemplar do subgênero informal terrir, que compreende aqueles filmes que transitam entre o horror e a comédia. Embora não se encaixe muito bem em nenhum dos dois, o fato é que A Hora do Espanto, ao ser visto em 2025, já com 40 anos de idade, provoca um certo carinho pela tosquice dos seus efeitos especiais e pela vontade genuína de fazer uma homenagem ao cinema. Só por conta desses dois fatores ele já merece ser revisitado.
A história é tão simples que chega a ser infame. Um adolescente chamado Charley Brewster (William Ragsdale) adora filmes de terror e assiste assiduamente um programa chamado “Fright Night”, sobre um caçador de vampiros, enquanto dá uns amassos na namorada Amy (Amanda Bearse, que no futuro viveria a icônica vizinha Marcy na série Married with Children).
Um dia, um homem estranho se muda para a casa vizinha à sua, e ele fica obcecado que o sujeito é um vampiro. Só que ninguém parece acreditar, o que inclui a polícia. Sua saga para tentar mostrar que está certo é, no final, o resumo do filme de Tom Holland.
Não há nada de brilhante nem de muito especial, com uma exceção: o filme nos entregou um dos vampiros mais sexies da história do cinema.
Uma homenagem ao cinema
Para quem entende um pouco sobre história do cinema, A Hora do Espanto é uma delícia. Afinal, trata-se de uma espécie de filme paródia que traz diversas referências: ao próprio cinema de horror, aos clássicos do cinema (há um dedinho de Janela Indiscreta, de Alfred Hitchcock), e ao espírito do tempo que vigorava naquele momento dos anos 1980. Mesmo com sua tosquice, há algo de irresistíveil na saga do menino Charley (embora ele mesmo seja chatíssimo).
Já na primeira cena, Charley está dando uns pegas na namorada, e entende-se que ambos são virgens. O clima está esquentando, mas o adolescente logo para tudo para poder ver o programa que passa na TV, capitaneado por um ator chamado Peter Vincent (Roddy McDowall). O nome do personagem homenageia duas pessoas importantíssimas dentro do cinema de horror: Vincent Price e Peter Cushing.
Ao ser visto em 2025, já com 40 anos de idade, A Hora do Espanto provoca um certo carinho pela tosquice dos seus efeitos especiais e pela vontade genuína de fazer uma homenagem ao cinema
Peter Vincent, aliás, é uma chave para entender o sentido desejado a esse filme. Durante o tempo em que apresenta o “Fright Night”, fica claro que a sua carreira de “caçador de vampiros” está prestes a acabar, e seu programa pode sair do ar. Os jovens agora se interessam cada vez mais pelos slasher movies, e o horror “tradicional” está morrendo. Frente aos óbvios filmes de matança, o subgênero dos vampiros tenta sobreviver como um território para um terror mais sutil, baseado na tensão que cresce aos poucos.
Mas voltemos ao menino Charley: no resto do filme, sua libido vai acabar e ele só vai se importar em investigar se o seu vizinho é ou não um vampiro. A comoção na época (e até hoje, vale dizer) é sobre o semblante do recém chegado Jerry Dandrige, papel do ator Chris Sarandon, então com 43 anos.
(Aqui, uma curiosidade: Chris Sarandon foi casado entre 1967 e 1979 com Susan Sarandon, e foi dele que ela ganhou seu sobrenome. Susan ainda estava no elenco de outro filme cult de horror, Fome de Viver, com Catherine Deneuve e David Bowie, e que foi lançado dois anos antes da A Hora do Espanto, em 1983. De certo modo, Fome de Viver é referenciado de forma discreta na obra de Tom Holland pelo clima de sedução envolvendo vampiros).
O “dono” do filme, de fato, é o personagem de Chris Sarandon. Ele é um vampiro que obedece os três pilares fundamentais obrigatórios a todos os exemplares dessa “raça”: é perigoso, misterioso e, claro, sexy. Sua presença enche a tela, de uma forma que vai além da qualidade de sua performance – que talvez possa até ser considerada meio canastrona.
Em várias discussões em fóruns de fãs do gênero, Jerry Dandrige aparece como um dos vampiros mais sexies do cinema. De fato, o personagem exerce o seu poder pelo sexo – seja quando é simpático com a mãe de Charley para poder ser convidado a entrar na casa dele, seja no seu poder de transformar uma menininha virgem em uma mulher desejante. Enquanto o vampiro é pura lascívia, o fã de filmes de terror (virgem) é puro medo e ansiedade.
Não há nenhuma grande novidade em A Hora do Espanto, mas o mesmo não se pode dizer sobre cenas memoráveis. Preste atenção na que ocorre em uma boate new wave em Dandrige e Amy dançam em uma espécie de jogo de atração e repulsa, mas que forma uma coreografia muito envolvente.
Ao mesmo tempo, há um tom de deboche em toda a cena, o que condiz plenamente com o espírito desse pequeno filme cult perdido nos anos 1980. Ele é capaz de criar alguma tensão e nos roubar umas boas risadas, mesmo quarenta anos depois.
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