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O terror do que não se explica em ‘A Hora do Mal’

Zach Cregger confirma em 'A Hora do Mal', grande sucesso de bilheteria, seu talento em explorar as zonas ambíguas do horror contemporâneo com um filme que começa como metáfora e termina como explicação, revelando tanto a força quanto os limites de seu olhar autoral.

porPaulo Camargo
4 de novembro de 2025
em Cinema
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Amy Madigan encarna a assustadora tia Gladys. Imagem: New Line Cinema / Divulgação.

Amy Madigan encarna a assustadora tia Gladys. Imagem: New Line Cinema / Divulgação.

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O roteirista e diretor Zach Cregger, revelado com o surpreendente Noites Brutais (2022), consolida em A Hora do Mal (Weapons, no original) uma trajetória que o coloca entre os autores mais interessantes do novo cinema de horror estadunidense — aquele que compreende o gênero não como simples gerador de sustos, mas como ferramenta de desconstrução do medo coletivo e das fissuras sociais que o alimentam.

Durante boa parte de suas duas horas de duração, o filme ocupa um espaço de rara eficácia: é, ao mesmo tempo, inquietante, misterioso, irônico e emocionalmente preciso. Cregger domina o território ambíguo onde o horror deixa de ser apenas uma manifestação sobrenatural para se tornar expressão do trauma e da paranoia de uma sociedade em colapso moral. Mas, na reta final, o diretor cede à tentação de explicar o inexplicável — e o que até então funcionava como metáfora aberta e pulsante se desfaz em um fechamento literal e redundante. O mistério, que deveria reverberar, é sufocado pela vontade de esclarecimento.

A Hora do Mal é um filme composto por partes, e essa escolha formal é central para compreender tanto suas virtudes quanto suas limitações. Dividido em capítulos nomeados a partir dos personagens, o longa alterna pontos de vista e temporalidades, montando um mosaico que obriga o espectador a recomeçar a cada nova sequência. A cada cartela com um novo nome — “Justine”, “Paul”, “Ben” —, o olhar se desloca, e a narrativa se reconfigura.

Essa fragmentação é um gesto que ecoa autores como Robert Altman ou Paul Thomas Anderson, cineastas que também trabalham com narrativas corais em que o sentido se constrói no entrelaçamento das experiências individuais. Em Cregger, porém, o dispositivo serve a outro propósito: produzir inquietação pela ausência de continuidade, frustrar o desejo de linearidade e, ao mesmo tempo, humanizar o enigma.

O filme se sustenta sobre uma premissa intrigante — uma sala de aula inteira de crianças desaparece misteriosamente às 2h17 da madrugada, sem deixar vestígios. No entanto, o verdadeiro enredo não está na busca por respostas, mas nas reações de quem tenta decifrar o ocorrido. Em cada personagem, há um reflexo diferente do medo: o medo da culpa, o medo da impotência, o medo de olhar para o próprio abismo.

É nesse ponto que A Hora do Mal se revela um filme de atores. Julia Garner, como a professora Justine, encarna uma tensão permanente entre a empatia e o desespero. Há algo de maternal e ferido em sua presença: uma doçura interrompida, como se a culpa pela tragédia coletiva fosse também uma culpa íntima, inconfessável. Alden Ehrenreich, no papel do policial Paul, oferece uma composição igualmente ambígua — é a figura da autoridade que investiga, mas que também carrega a violência do sistema que representa. Ele não é o herói, mas o vetor de uma ambiguidade moral que atravessa todo o filme. Já Josh Brolin, com sua habitual sobriedade, funciona quase como uma âncora narrativa: seu corpo em cena traz gravidade e memória, como se o horror atual ecoasse velhas culpas da América profunda.

Mas é em Amy Madigan, no papel da tia Gladys Lilly, que A Hora do Mal encontra seu ponto de virada mais desconcertante. À primeira vista, ela parece apenas uma figura secundária, uma parente excêntrica que surge em meio ao caos, oferecendo calma e estrutura. No entanto, à medida que o filme avança, Gladys revela-se o verdadeiro eixo de horror — uma presença hipnótica e manipuladora que, por trás do afeto doméstico, esconde um poder sombrio.

Mas é em Amy Madigan, no papel da tia Gladys Lilly, que A Hora do Mal encontra seu ponto de virada mais desconcertante.

As atuações, contidas e precisas, encontram ressonância na mise-en-scène de Cregger. Os enquadramentos amplos e a fotografia dessaturada constroem uma paisagem emocional que remete a um país exaurido, onde o mal não é um intruso, mas uma energia difusa que impregna o cotidiano. O horror não vem de fora: ele é o ar que se respira.

Embora o filme nunca se torne abertamente político, A Hora do Mal é atravessado por uma inquietação moral e social que o aproxima de obras como Corra! (de Jordan Peele) e Hereditário (de Ari Aster). A escola, o subúrbio, o policial, a professora, as crianças desaparecidas — todos são signos de uma América em ruínas, onde o trauma coletivo é reencenado sob novas formas. O desaparecimento dos jovens pode ser lido como uma alegoria da infância perdida da nação, uma sociedade que se nega a amadurecer, que foge de si mesma no meio da noite.

A insistência em encontrar respostas — por parte dos personagens e, por fim, do próprio filme — parece revelar o medo que o país tem do vazio, da ausência de sentido. O mal, em Cregger, não é um demônio externo: é uma construção cultural, um espelho da culpa ocidental. Há, em sua abordagem, algo de cosmológico: o mal como estrutura, como repetição inevitável. O filme parece sugerir que toda tentativa de compreender o inexplicável está fadada a fracassar — e, quando Cregger finalmente tenta explicar, trai a própria força poética de sua proposta.

É justamente na reta final que A Hora do Mal se perde. O diretor, talvez temendo deixar o público à deriva, se empenha em amarrar os fios soltos, preenchendo as lacunas com informações que, em vez de esclarecer, empobrecem. A elipse dá lugar ao discurso; o silêncio, à didática. O resultado é um filme que começa como experiência sensorial e termina como relatório explicativo. O que antes era vertigem se transforma em decodificação — um erro comum em obras que confundem ambiguidade com incompletude.

Ao tentar dar sentido a tudo, Cregger reduz a potência simbólica do seu próprio mistério. Ainda assim, a falha é reveladora: mostra o risco de se criar no limite entre o popular e o autoral, entre o cinema de gênero e o cinema de ideias. É o tipo de desequilíbrio que, paradoxalmente, confirma a ousadia de um autor disposto a experimentar dentro das convenções do horror contemporâneo.

Mesmo com seu desfecho irregular, A Hora do Mal é um filme que merece ser visto — e debatido. Ele reafirma a vitalidade do horror como linguagem crítica, como modo de pensar o presente através do medo e da fabulação. O que Cregger propõe é, afinal, uma reflexão sobre o próprio ato de olhar: até que ponto precisamos compreender para temer? O cinema, como o medo, talvez funcione melhor quando não se explica. E o verdadeiro terror, parece nos dizer A Hora do Mal, está justamente no que permanece fora de foco — naquela zona cinzenta entre o que vemos e o que imaginamos.

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Tags: A Hora do MalCinemaCrítica de CinemaJosh BrolinJulia GarnerZach Cregger

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