Segundo filme do aclamado designer de moda e diretor norte-americano Tom Ford, que estreou há sete anos com o sensível Direito de Amar, Animais Noturnos, em cartaz no Brasil, confirma o que seu longa-metragem de estreia já anunciava: sua incursão na sétima arte não será uma atividade bissexta, e ele já se mostra um dos realizadores mais instigantes na Hollywood de hoje. Neste segundo filme, ele expande seus horizontes, e aposta em um drama que mantém um criativo, e perturbador, diálogo intertextual tanto com a tradição do cinema quanto da literatura noir.
Indicado ao Globo de Ouro nas categorias de direção e roteiro, Ford se mostra um habilidoso narrador. Como já havia demonstrado em Direito de Amar, ele tem um depuradíssimo senso estético, o que poderia se tornar um problema, um tique, caso ele não começasse a dar passos mais ousados como encenador e contador de histórias por meio de imagens em movimento. Mantém total domínio do espaço e design, mas além de visualmente impecável, seu Animais Noturnos também é um notável exercício de narrativa cinematográfica, no qual o belo e o grotesco não apenas se contrapõem, mas se sobrepõem até se integrarem na mesma tessitura.
Vencedor do Grande Prêmio do Júri (Leão de Prata) no Festival de Veneza deste ano, Ford uma obra visualmente impactante que fala, sobretudo, de vingança.
Adaptação do romance Tony and Susan (inédito no Brasil), de Austin Wright, Animais Noturnos acompanha uma mulher (Amy Adams, de A Chegada), curadora de arte bem-sucedida, que parece estar em um limbo emocional: ela vive um casamento aparentemente perfeito, que aos poucos se esfacela em um vazio existencial perturbador. Sua angústia, já perceptível nas sequências iniciais, se evidencia quando recebe de seu ex-marido (Jake Gyllenhaal, de O Segredo de Brokeback Mountain) um pacote, contendo os originais do novo romance escrito por ele, também intitulado Animais Noturnos. Nós, como espectadores do filme, navegamos pela obra por meio de subjetividade da personagem: no livro, a família de um professor (também vivido por Gyllenhaal, em uma projeção de Susan) vive um pesadelo extremamente violento no meio do deserto do Texas, terra natal de Ford.
Costurando presente e passado de Susan com a história do romance, o diretor ousa, dá provas de que quer se desafiar, buscando expandir seu cinema para além dos limites de sua área de conforto. Tira atuações memoráveis de todo elenco, a começar por Amy Adams e Jake Gyllenhaal, mas também de Aaron Taylor-Johnson (de Anna Karenina), indicado ao Globo de Ouro de melhor ator coadjuvante, e Michael Shannon (de Foi Apenas um Sonho), que interpretam personagens do romance dentro do filme.
Vencedor do Grande Prêmio do Júri (Leão de Prata) no Festival de Veneza deste ano, Ford entrelaça com impressionante segurança os três fios narrativos, graças a seu ótimo roteiro, e constrói uma obra visualmente impactante que fala, sobretudo, de vingança, mas também estabelece um diálogo metalinguístico muito instigante, ao se debruçar sobre a tradição do cinema noir, de personagens, falhos, atormentados e sombrios, em um mundo degradado. Ford prova que sua genialidade não se limita à moda.
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