“Uma obra cinematográfica incendiária” (Collider). “Alegremente subversivo” (The Playlist). “Inesperado e complexo” (Mashable). “Certamente provocará debates após a última cena chocante” (Entertainment Weekly). “Sexy, inteligente e totalmente assustador” (Indiewire). São chamativos os trechos de diversas críticas exibidos no trailer de Bela Vingança (2020). E não é que todos esses elogios são mesmo bastante válidos e oportunos?
Ao se acompanhar esta produção com direção e roteiro de Emerald Fennell, observa-se uma Carey Mulligan impecável no papel de Cassandra, a protagonista que é a materialização da depressão, graças a um evento traumático de seu passado. Materialização da depressão e do desejo de vingança, gritante no título em português. Toda semana ela vai a uma boate e, fingindo estar muito bêbada, espera ser ajudada por algum “bom rapaz”. O desfecho é quase sempre o mesmo: o homem se oferece para levá-la embora, mas, devido às condições da jovem, não pensa muito antes de mergulhar em investidas sexuais ofensivas.
Partindo desse fato, o filme trabalha de forma “incendiária” (para usar o termo usado pela Collider) a visão polêmica de que uma mulher, ao beber, expõe-se ao risco de virar alvo fácil de “predadores masculinos”. Eles costumam ser socialmente inocentados por sua conduta abusiva. “Ah, ela tava querendo”. “Ah, ela pediu”. “Ah, ela se arriscou”. São várias as justificativas que começam com um “Ah…” e terminam das mais diversas formas, mas sempre culpando a mulher. Essas desculpas são destruídas pela trama, marcada por um roteiro majestoso que, não por acaso, ganhou o Oscar 2021 na categoria Melhor Roteiro Original.
O roteiro concede suaves revelações gradualmente. É como se as informações estivessem cobertas por véus que são sutilmente retirados para que o espectador consiga, aos poucos, conectar os fatos, fazer as devidas relações, ver claramente o que acontece.
A acidez da obra já começa em seu título original, Promising Young Woman. É uma referência – bastante irônica – ao caso Brock Turner, estudante da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, condenado por estupro e que recebeu uma sentença consideravelmente branda do juiz responsável pelo caso.
A acidez da obra já começa em seu título original, Promising Young Woman. Em livre tradução, significa “Jovem Promissora”. É uma referência – bastante irônica – ao caso Brock Turner, estudante da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, condenado por estupro e que recebeu uma sentença consideravelmente branda do juiz responsável pelo caso. Segundo o magistrado, o estuprador era um jovem promissor, que aprendeu a lição e não representava risco para a sociedade.
Uma possível cura para o trauma do passado da protagonista chama-se Ryan (Bo Burnham). É um ex-colega de faculdade que se mostra compreensível, paciente, leve e interessado em construir uma relação saudável. Se o espectador tem dúvida de sua leveza, que então preste atenção na cena em que ele dança e dubla “Stars are Blind”, de Paris Hilton, em uma farmácia, diante de uma Cassandra envergonhada.
Da acidez do título original à leveza da cena de Ryan dançando e dublando “Stars are Blind”, passando pela força de uma cena envolvendo uma versão recente de “It’s Raining Men”, Bela Vingança é um misto de suspense e drama, não sem pitadas de humor. O filme ganhador do Oscar 2021 de Melhor Roteiro Original é capaz de impactar, provocar risos, fazer chorar e motivar o espectador a repensar posições preconcebidas e muito bem arraigadas. A cena com a reitora da universidade onde Cassandra estudou que o diga.