Cláudio Marques e Marília Hughes tem apreço por abordar temas que, ainda que muito importantes, parecem não encontrar espaço no grande cinema. Depois do tocante, denso e original Depois da Chuva, em que se debruçaram sobre a reabertura política e o processo de redemocratização do Brasil, período pouco explorado pela cinematografia brasileira, Marques e Hughes vão a Serra do Ramalho, cidade no sertão da Bahia.
Serra do Ramalho foi criada por famílias que foram expulsas de suas cidades para a construção da Usina Hidrelétrica de Sobradinho. Para que a barragem fosse construída no rio São Francisco, inúmeras cidades foram inundadas, expulsando da região seus moradores. Este é mais um exemplo de ações horríveis que aconteciam nas regiões interioranas do Brasil durante o período militar e que pouca (ou nenhuma!) informação temos.
Mas o contexto trazido pelos diretores é apenas pano de fundo para criar uma relação com o presente. A Cidade do Futuro é um filme sobre resistência, mas neste caso, de resistência ao conservadorismo. O longa-metragem acompanha as histórias de Milla, Gilmar e Igor, personagens que transitam na linha tênue entre ficção e realidade, cruzando acontecimentos reais das vidas dos atores com o roteiro previamente imaginado por Cláudio Marques.
O longa-metragem acompanha as histórias de Milla, Gilmar e Igor, personagens que transitam na linha tênue entre ficção e realidade, cruzando acontecimentos reais das vidas dos atores com o roteiro previamente imaginado por Cláudio Marques.
Gilmar é professor de História em Serra do Ramalho; Milla é professora do grupo de teatro da escola local; Igor é um vaqueiro. A força do filme reside menos na interpretação dos três, atores amadores, e mais em seus complexos personagens e no que os une.
Gilmar e Igor são homossexuais e se amam; Milla é bissexual; Gilmar e Milla desejam ter um filho; Gilmar, Milla e Igor enfrentam o conservadorismo local – de colegas de trabalho, amigos, familiares e outros habitantes de Serra do Ramalho – para serem uma família.
Marques e Hughes deixam, assim como feito em Depois da Chuva, pequenas lacunas propositais em A Cidade do Futuro. Desta maneira, os diretores convidam o público a preenchê-las e significá-las conforme sua bagagem cultural e de vida, criando diferentes narrativas intermediárias para a mesma obra. Um recurso ousado, diga-se, de quem tem confiança que o subtexto será bem absorvido pelo espectador, ou que, ao menos, causará uma reflexão importante sobre o retrocesso conservador a que assistimos diariamente.
A Cidade do Futuro tem mais uma exibição no 5º Olhar de Cinema. Hoje, dia 14, às 19h, no Espaço Itaú.
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