Longa-metragem polonês que disputa neste domingo o Oscar de melhor filme internacional, EO é protagonizado por um burro, mas não é uma fábula convencional. Embora o animal seja o personagem central, ele não ganha subjetividade humana, traço recorrente em obras sobre bichos, que se tornam, na maior parte das vezes, projeções antropomorfizadas.
Talvez o aspecto mais interessante, e original em certa medida, de EO, é o fato de o longa-metragem de Jerzy Skolimowski mostrar como alguns animais, como o burro, estão sujeitos ao homem, às pessoas, que deles se apropriam à sua própria conveniência das mais diversas formas – transporte, força de trabalho, entretenimento e, por fim, alimentação –, negando-lhes o direito à existência plena, dissociada de sua utilidade.
Talvez o aspecto mais interessante de EO é o fato de o longa-metragem de Jerzy Skolimowski mostrar como alguns animais estão sujeitos ao homem, às pessoas, que deles se apropriam à sua própria conveniência das mais diversas formas.
Vencedor do Prêmio do Juri e de melhor trilha sonora, assinada por Pawel Mykietyn, no Festival de Cannes 2022, além de ter sido reconhecido por várias associações de críticos, Eo se distancia, já em suas cenas iniciais, da linguagem documental.
Nas primeiras sequências, quando o burro está inserido em um contexto circense, e integra o número de uma artista, Kasandra (Sandra Drzymanska), que por ele nutre afeto, e apego, o animal surge na tela de forma quase onírica, como uma extensão da subjetividade dessa personagem.
Quando a presença de bichos no circo se torna intolerável, por ser considerada cruel, e condenada pelos defensores dos direitos animais, ele é descartado. Deveria passar o resto de seus dias tranquilo em uma propriedade rural, mas não é o que acontece.
Sua submissão ao mundo dos seres humanos é irreversível, e inicia-se então uma espécie de via crúcis de abandonos, exploração e dor – não há como esquecer que, desde o nascimento de Jesus, a figura do burro está ligada à mitologia cristã.
Há, no olhar do animal, uma melancolia quase insuportável, porque o diretor, sabiamente, opta por mantê-la envolta por uma aura de mistério, algo inacessível. Afinal, nunca será capaz de decifrá-la por inteiro. Ele é esse outro, não humano, que nos desafia durante toda a narrativa.
Ao longo de sua jornada, o burro encontra pessoas boas, piedosas, mas também cruéis indiferentes ao animal, em uma Europa de incertezas, fragilidades, que de certa forma ganha conotações simbólicas em um momento no qual o Velho Continente se depara, mais uma vez, com os fantasmas do passado, que não são um tema explorado pelo filme, mas são indissociáveis da narrativa: EO foi lançado já durante a guerra na Ucrânia, país vizinho da Polônia, cuja história é marcada por conflitos bélicos. Também por isso, é uma obra imersa em profunda tristeza, desesperança.
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