Há filmes que se tornam emblemáticos de seu tempo, seja por conta de aspectos estéticos e técnicos, seja pelos temas que abordam. Na safra atual, o longa-metragem norueguês A Pior Pessoa do Mundo, de Joachim Trier (de Thelma), que chega no fim de março aos cinemas brasileiros, me parece ter muitos dos atributos necessários para ser visto, no futuro, como uma obra muito significativa desta terceira década do século 21, sobretudo no que diz respeito à representação dos anseios femininos contemporâneos.
Julie, protagonista do filme, é apaixonante, a despeito (ou por causa) de todas as suas falhas. A personagem, que deu à incrível Renate Reinsve, o prêmio de melhor atriz no Festival de Cannes em 2021, nos possibilita um divertido e, ao mesmo tempo, tocante mergulho na sua subjetividade.
Indicado aos Oscar de melhor filme internacional e roteiro original, A Pior Pessoa do Mundo tem uma narrativa inventiva. A jornada de Julie é dividida em um prólogo, 12 capítulos, e um epílogo, transitando entre a comédia e o drama. Nós acompanhamos por pouco mais de duas horas a busca da personagem por si mesma, da pós-adolescência aos seus 30 e tantos anos.
Linda e inteligente, Julie parece ter um futuro brilhante pela frente. Mas, como tantos em sua geração, ela não tem certeza do que espera da vida. Primeiro, por conta de suas excelentes notas no ensino médio, ela ingressa na faculdade de Medicina, para descobrir, já nas primeiras aulas de anatomia, que não é o curso para ela. Muda, então, para Psicologia, que também não corresponde a suas expectativas. Daí resolve ser fotógrafa, mas acaba trabalhando em uma livraria. Nada a satisfaz completamente.
A jornada de Julie é dividida em um prólogo, 12 capítulos, e um epílogo, transitando entre a comédia e o drama.
A vida sentimental de Julie não é menos atribulada. Por algum tempo vive uma relação estável com Aksel (Anders Anielsen Lie), autor de uma bem-sucedida série de quadrinhos, bem mais velho que ela. Algo, no entanto, parece sempre estar fora do lugar, como se, como ela mesma diz, fosse coadjuvante da própria vida, nunca a protagonista.
Essa sensação de inadequação pode ter a ver com a distante relação com o pai, a fazendo tomar atitudes questionáveis, como se estivesse sempre se autossabotando, e começando de novo. O fantasma do fracasso está sempre à ronda.
Muito bem escrito e dirigido por Trier, que intercala momentos de leveza a outros bastante comoventes, A Pior Pessoa do Mundo é um daqueles filmes dos quais não se sai indiferente e nos faz pensar sobre nossas próprias vidas e escolhas, não importando se você é homem ou mulher. Mas, certamente, o público feminino, como já vem acontecendo nos países onde foi lançado, vai se identificar muito com as dores e delícias de Julie, em sua procura por um lugar no mundo.
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