Quando Donald Trump venceu as eleições norte-americanas, o editor do site de humor Cracked escreveu um texto (sério) procurando desvendar o resultado das urnas. Parte do que David Wong apontava em seu texto era, justamente, a representação do “caipira”, o embate cidade versus campo, o homem tecnológico contra o homem analógico, o racional contra o irracional. No cinema é difícil encontrar um gênero mais norte-americano que o faroeste, em especial por ele ter sido responsável por contar um pedaço da história americana.
A Qualquer Custo, longa-metragem dirigido por David Mackenzie, que estreia hoje nos cinemas nacionais é um caso clássico (ainda que moderno) de faroeste. A história do filme se passa no Texas, e procura explorar não apenas o cenário e os costumes texanos, mas também a imagem histórica de seus cidadãos. O roteiro de Taylor Sheridan é interessante por fugir da estereotipação à qual Wong se referia em seu artigo. Nenhum atributo que corresponde às questões sociológicas e geográficas foi deixado de fora, porém, Sheridan prefere procurar traduzir o estágio atual da região, um tanto abandonada e sofrida por conta da forte crise econômica que atingiu o setor automobilístico e de combustíveis. Vale lembrar que o Texas é um estado extremamente dependente da exploração e produção de petróleo e gás natural.
O Texas e os estados vizinhos não vivem mais o auge de anos atrás, e esta nova crise trouxe conflitos entre a vangloriação de seu passado e a realidade empobrecida e carente de sua população. E é neste contexto que encontramos os personagens de A Qualquer Custo, que emergem da “nova América” que quer ser grande novamente.

O roteiro de Taylor Sheridan é interessante por fugir da estereotipação à qual Wong se referia em seu artigo.
Toby Howard (Chris Pine, de Star Trek) e seu irmão Tanner (Ben Foster, de Warcraft) vivem no oeste texano. Pressionados pela proximidade da hipoteca da fazenda da família, os dois resolvem assaltar bancos para obter a quantia necessária para quitar a dívida. A única “regra” é que apenas agências do banco que cobra a hipoteca sejam assaltadas. Tanner, um ex-condenado, tem uma personalidade selvagem e bruta, ao contrário de seu irmão, sem qualquer espécie de envolvimento com crimes anteriormente.
No caminho dos irmãos estão o veterano delegado Marcus Hamilton (o decepcionante Jeff Bridges) e seu companheiro Alberto Parker (Gil Birmingham). Hamilton está próximo de sua aposentadoria, mas resolver este caso de roubos, seu último, move o delegado. Rapidamente ele descobre os métodos empregados pela dupla e passa a esperar um vacilo, ou que consiga antecipar o próximo passo a ser dado por eles.
David Mackenzie sabe explorar muito bem o roteiro que tem em mãos, e constrói bem a brutalidade esperada daquela sociedade, acostumada a andar armada para defender, a qualquer custo, sua propriedade, seus bens, sua família e seu estilo de vida. Entretanto, apesar de todo esforço em ser sutil, seu elenco tropeça em representações caricatas, resultando em situações previsíveis, ainda que Chris Pine seja uma ótima surpresa (e exceção).
A Qualquer Custo funciona dentro de sua proposta, mas sua falta de ambição faz o longa carecer, também, de alma. A força do filme se resume à excelente trilha sonora, composta por Nick Cave e Warren Ellis, à boa direção de fotografia e à interessante representação do contexto texano atual. Talvez não seja pouco, mas era de se esperar muito mais de um filme com 4 indicações ao Oscar (melhor filme, melhor ator coadjuvante – Bridges -, melhor roteiro original e melhor edição).
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