O grande trunfo de Rua Cloverfield, 10, em tempos nos quais o cinema hollywoodiano aposta no mais do mesmo, é afastar-se da obviedade. E da pirotecnia, outro mal recorrente nas telas, optando pela dramaturgia, pela construção de personagens que conseguem, senão sustentar a trama, ajudam a conduzi-la por conta de sua complexidade.
O filme de Dan Trachtenberg, um diretor ainda pouco conhecido mas bastante promissor, flerta com o cinema de gênero, mas não se assume como tal. Fazê-lo seria desnudar-se para o espectador, e isso é tudo o que ele evita ao longo de quase toda a narrativa. É um drama psicológico que flerta com o cinema catástrofe, mas também com o de horror, podendo dialogar com a ficção científica e o suspense. Dá pistas falsas, outras mais críveis. O resultado é bastante envolvente. E é o que realmente importa, no fim das contas.
Produzido por J. J. Abrams (de Star Wars: o Despertar da Força), o longa de Trachtenberg tem um prólogo e tanto. Vemos Michelle (Mary Elizabeth Winstead, de Scott Pilgrim Contra o Mundo), bastante angustiada por alguma razão que nunca é totalmente revelada, pegando a estrada, para desespero de seu namorado. Algo muito grave parece ter acontecido.
Com uma estrutura narrativa que às vezes se aproxima do teatro, investindo na força dos personagens e dos diálogos, Rua Cloverfield, 10 é um filme excêntrico.
Bastante tensa, ela acaba sendo vítima de um grave acidente. Quando acorda, descobre-se prisioneira em uma espécie de bunker de Howard (um excelente John Goodman, de O Grande Lebowski), que pode ser um psicopata, mas insiste que, na verdade, salvou a vida de Michelle: o país, ou o mundo, garante ele, teria sido alvo de um grande ataque químico, e os dois, mais Emmett (John Gallagher Jr., de Temporário 12), um jovem vizinho, seriam os únicos sobreviventes por aquelas bandas. Verdade ou mistificação?
Com uma estrutura narrativa que às vezes se aproxima do teatro, investindo na força dos personagens e dos diálogos, Rua Cloverfield, 10 é um filme excêntrico. Prefere o existencialismo, a dúvida, “o que pode ser”, ao didatismo e, sobretudo, à ação. Ela não é ausente, mas não é um fim em si mesma, e sim consequência da trama, que vai se revelando aos poucos, sem pressa, enquanto os três protagonistas se embatem em uma atmosfera claustrofóbica e muito envolvente.
O roteiro, que conta com Damian Chazelle (indicado ao Oscar por Whiplash: Em Busca da Perfeição), é o ponto forte do filme, bem acima da média, além da brilhante atuação de John Goodman, com chances de ser lembrada na próxima temporada de prêmios.
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