Bertrand (Mathieu Amalric) está tão deprimido que despeja medicamentos nos cereais que consome no café da manhã. Café nem tão da manhã assim, já que costuma levantar bem tarde em relação aos demais membros de sua família.
Ele está há dois anos desempregado, construiu uma relação tensa com o filho e vive ao lado de uma esposa que, apesar de bastante compreensiva, tem a aparência de alguém que sofre em silêncio para não complicar ainda mais a situação. Ele até tenta, mas é difícil encontrar emprego e isso só movimenta ainda mais o ciclo negativo de sua patologia.
A vida de Bertrand segue nesse ritmo até ele ver o anúncio de que a equipe masculina de nado sincronizado da piscina municipal do bairro onde mora está precisando de novo integrante. Obviamente, ele se inscreve e passa a conviver com pessoas que enfrentam os mais diversos problemas.
O grupo inusitado, dessa forma, acaba sendo tanto pretexto para que todos compartilhem suas angústias e se ajudem uns aos outros quanto oportunidade para que eles aperfeiçoem suas técnicas de nado a ponto de resolverem participar de um campeonato mundial na modalidade.
É com essa curiosa premissa que Um Banho de Vida (2018) ganha as telas e tende a ganhar, também, o espectador. A sua maneira agridoce de espelhar a vida fora das telas é louvável, característica bastante presente no bom cinema francês.
Dirigido pelo também ator Gilles Lellouche (de Assim é a Vida, de 2017), Um Banho de Vida tem um título em português um tanto quanto óbvio e pobre (no original é Le Grand Bain), mas é competente na intenção de mesclar o humor com pinceladas de drama, mostrando o quanto um filme pode divertir e, ao mesmo tempo, sensibilizar e motivar a empatia.
A produção tem um quê de Pequena Miss Sunshine, com seu grupo de personagens desajustados e uma viagem de trailer em busca de uma competição para a qual eles têm muitas chances de saírem derrotados.
A produção dirigida por Gilles Lellouche tem um quê de Pequena Miss Sunshine (2006), com seu grupo de personagens desajustados e uma viagem de trailer em busca de uma competição para a qual eles têm muitas chances de saírem derrotados.
Tudo pontilhado com situações cômicas e alguns diálogos ácidos que exploram uma sinceridade capaz de ferir os mais imaturos. A película lembra, também, Ou Tudo ou Nada (1997), comédia britânica na qual um grupo de homens desempregados resolve fazer striptease para sair da crise.
A relação dos nadadores com sua treinadora cadeirante de métodos severos, interpretada por Leila Bekhti, rende algumas das cenas mais hilárias. Mas não apenas. Ela assume o lugar de outra treinadora que, como os “pupilos”, tem problemas. Essa substituição da responsável pelos treinos representa para os marmanjos a chance de amadurecimento (mesmo que forçado) não só no aprendizado da natação sincronizada mas, também, na administração de suas mais diversas questões pessoais.
Difícil não destacar, também, a maneira habilidosa com que este filme francês brinca (ou abre discussões sérias) sobre a questão de gênero ao lançar seus holofotes sobre homens que praticam uma atividade esportiva tradicionalmente atribuída a mulheres.
Ao entrelaçar de modo tão intrincado tantas facetas dessa história, Um Banho de Vida é capaz de surpreender positivamente e revelar-se um filme de superação acima da média. Aliás, a produção concorreu a dez indicações ao César, o “Oscar” do cinema francês.
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