Primeira impressão: “Quanta gente jovem!”.
Ouvindo outros gêneros, às vezes, tenho mesmo a percepção de que o rap tem se tornado coisa de criança. KRS-One confirma.
Mas, ainda que a situação se aplique a alguns grupos, não é esse o caso de Renato Froid. Vindo de uma cidade que sufoca com o seu ar seco e sua arquitetura que abriga políticos, olhos e salários de todo o país, o brasiliense faz da sua música um grito necessário em um ambiente opressor. Sua voz, no entanto, foi ouvida em todo o país e colocou BSB no mapa como antes fizeram Gog, Câmbio Negro e Cirurgia Moral.
“Cara, é a gente que tá ficando velho!”.
Pode ser.
Comecei a frequentar festas por volta dos 15 anos. Logo, uma criança. Hoje, aos 30, talvez encontre-me na situação de quem vem com aquele papo de que “no meu tempo é que era bom”. Mas não. O rap no Brasil está agora no seu melhor momento.
A existência de um artista como Froid é um dos indícios. A sua originalidade, mesmo que seja um reflexo da asfixiante capital federal, encontra brechas para a ironia e nos proporciona um necessário respiro.
Essa oxigenação, aliás, é o que mantém vivo o organismo rap, que precisa de novas células, um novo público e novos artistas assim como Letrash, grupo formado ano passado em Curitiba e que tocou no mesmo evento apresentando sua aposta no tom espirituoso que faz pensar e balançar.
No intervalo das apresentações, que ficaram sob responsabilidade de Givv e Bastardman, uma mistura entre novos e antigos sons.
Não tem erro. Bota RZO, Racionais, Planet Hemp, Criolo e todo mundo curte. Por outro lado, há também novidades. Além de dar visibilidade para artistas novos como Djonga, Nectar Gang, Baco e Diomedes há também espaço para a música curitibana. Inthefinityvoz e Hurakán são artistas locais que não só tocam na pista como também agradam o público.
Isso, há não muito tempo, seria quase impensável.
A sua originalidade, mesmo que seja um reflexo da asfixiante capital federal, encontra brechas para a ironia e nos proporciona um necessário respiro.
Minha garotinha ruiva, iniciada nesta ocasião, notou outro ponto positivo: “Apesar de ser uma balada hétero, fui no banheiro e ninguém mexeu”.
Óbvio, isso deveria ser comum. Infelizmente não é.
Outro aspecto que poderia fazer com que um evento como esse pudesse ser evitado seria a possibilidade de brigas.
Mas não.
Não houve nada de garrafas, cadeiras ou sofás arremessados como já aconteceu em Curitiba.
Para cima só os copos dizendo saúde como na música do MC Cabes, mestre de cerimônia da noite que, sendo da minha geração, sobrevive bem ao tempo.
Já o time do Pezo Squad chama a atenção para o palco, inicialmente pelo número de integrantes. O que é intrigante. São raros, para não dizer nulos, os casos positivos na cidade em que há uma união tão grande como a apresentada pelo coletivo. Enche o palco de gente e a gente de esperança.
Um dos ensinamentos do rap recente vem dos cariocas do Bloco 7 e a junção promovida por eles. É óbvio: quanto mais pessoas unirem forças, mais fortes serão. Na prática, entretanto, o que acontece na maioria dos casos é uma briga de poderes que enfraquece a todos.
O esquadrão de Curitiba, se mantiver o ideal, tende a chegar longe, mas para isso é também preciso apostar na originalidade em todos os aspectos, tanto na diferenciação musical de cada integrante quanto na questão visual.
A aparência, aliás, é um dos diferenciais de Froid, que criou sua própria marca por conta da maneira com que prende os dreadlocks. Mas, claro, não é só isso.
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Outra questão, além da música, que o torna um dos mais relevantes nomes da atualidade, está no fato de dividir essa relevância. Por isso, subiu ao palco com uma equipe composta pelos MCs Menestrel, LiFlow e Distinto. Juntos, promoveram uma apresentação enérgica e até catártica ao entoar não apenas as canções solo do, até então, integrante do Um Barril de Rap, mas também músicas colaborativas como as cyphers Poetas no Topo, Favela Vive e as lançadas pelo selo Rap Box.
O canal, inclusive, foi o responsável pela versão acústica das quatro músicas que encerraram o show do MC que faz referência ao pai da psicanálise, Sigmund Freud, e promoveu uma sessão de terapia na noite da última sexta, fazendo notar que, claramente, o rap não é mais o mesmo.
Ainda bem.