Em 23 de junho de 1968, o jornal carioca Correio da Manhã publicou uma dura crítica de Frankenstein Contra o Mundo (1965). O texto, que não é assinado, descreve que produção como uma “aventura de TV ‘National Kid’, que debilita mentalmente as crianças brasileiras, ajudando-as a se tornarem arruaceiras contumazes” (leia aqui).
O comentário é um tanto duro com o filme, cuja narrativa é bastante dramática e trágica. Dirigido por Ishirô Honda, a obra começa durante a Segunda Guerra Mundial, quando um grupo de soldados nazista invade o castelo de Victor Frankenstein para roubar um misterioso baú. O pacote é levado para um submarino, depois afundado por japoneses. A caixa vai parar em um laboratório em Hiroshima, onde é aberta. Dentro, há o coração vivo do monstro de Frankenstein. No minuto seguinte, a cidade é devastada pela bomba atômica.
Essa vertiginosa sequência de acontecimentos ocorre em menos de 10 minutos. A trama começa de verdade após um salto temporal de 15 anos. Um trio de cientistas – formado por James Bowen (Nick Adams), Ken’ichiro Kawaji (Tadao Takashima) e Sueko Togami (Kumi Mizuno) – fica fascinado com a estranha habilidade de força e crescimento de uma criança, que tem as feições da maquiagem de Boris Karloff em Frankenstein (1931). O personagem, que cresce a cada cena, vira um gigante. Não demora até que a criatura se revele como um ser vivo regenerado do coração irradiado pela energia nuclear de Hiroshima.
‘Frankenstein Contra o Mundo’ tem raízes profundas na metáfora nuclear. Tal qual ‘Godzilla’ (1954), o monstro de Frankenstein aqui também é consequência da bomba dos americanos.
Depois de ficar grande demais, o monstro foge para a floresta e passa a ser perseguido pelo exército. A trama rocambolesca ainda insere um segundo monstro lá pela metade da história: um dinossauro chamado Baragon, que destrói diversas cidades. A culpa da devastação recai sobre o jovem e indefeso gigante.
Frankenstein Contra o Mundo tem raízes profundas na metáfora nuclear. Tal qual Godzilla (1954), o monstro de Frankenstein aqui também é consequência da bomba dos americanos. A diferença é que a criatura aparece é enquadrada com empatia pela câmera. Os vilões, em alguns momentos, são membros da própria sociedade japonesa, que não ferozmente persegue o personagem.
Com efeitos visuais de Eiji Tsuburaya, o longa-metragem tem cenas grandiosas e que representam o melhor do cinema kaiju da década de 1960. Pouco apreciada pelo público ocidental nos últimos anos, a obra em nada lembra a narrativa de National Kid, além do fato de ter um gigante lutando contra um monstro em roupa de borracha.
O filme é a materialização antiga de um desejo da Toho de trabalhar com o universo criado por Mary Shelley. Frankenstein quase lutou contra King Kong, em 1963, e Godzilla, em 1964. O conceito explorado em ambos os filmes evoluiu para essa pequena pérola da ficção científica, vastamente criticada pela imprensa brasileira na época da sua estreia. Teve uma sequência, A Invasão dos Gargântuas, lançada em 1966.