“Um tapa na cara” resume bem o documentário O Começo da Vida, que trata, de forma sensível e madura, as questões acerca da primeira infância – período que vai da gestação até os seis anos de idade. Com trilha sonora e fotografia agradável, é daqueles filmes nos quais você não vê o tempo passar. Estreou na semana passada em todo o Brasil e é uma produção da Maria Farinha Filmes, produtora que em outras oportunidades já tratou de temas relacionados à infância, como obesidade infantil, publicidade voltada para crianças e a importância do brincar.
A obra traz entrevistas certeiras com pesquisadores, famílias e crianças de todo o mundo. Faz um retrato do que é ser criança, da importância desse período da vida e endossa que o que se vive na primeira infância vai influenciar em toda a vida adulta. “A ciência nos traz evidências de que o pleno desenvolvimento no começo da vida é essencial para a construção de uma sociedade mais justa”, diz Eduardo Queiroz, diretor-presidente da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, uma das entidades apoiadoras do projeto.
Ou seja, mostra que as crianças não podem ser negligenciadas nem menosprezadas.
Para pais e não-pais, o documentário é uma oportunidade de refletir sobre como conviver com crianças, respeitando o fato de que elas estão em uma fase intensa de experimentações. Até são rotuladas como “cientistas”, uma vez que, quando fazem repetidas ações não estão necessariamente errando, mas experimentando. Cabe aos adultos promover liberdade e apoio para os experimentos dos “pequenos Einstens”.
O documentário é uma oportunidade de refletir sobre como conviver com crianças, respeitando o fato de que elas estão em uma fase intensa de experimentações.
Há quase um ano, vivencio e leio muito sobre a infância. O documentário parece como uma pequena luz no fim do túnel. Em tempos de noticiário político nacional sombrio, que anuncia um tempo incerto; e de movimentos ao redor do mundo pela exclusão social dos pequenos, é bom ver uma obra que relembra que as crianças pertencem à humanidade inteira – não apenas aos pais.
Se os argumentos mais sentimentais não valem pra você, segue aquilo que poderá entender: o investimento em infraestrutura para os pequenos e o apoio à parentalidade rende mais do que a Bolsa de Valores de New York. É o que diz James Heckman, vencedor do Prêmio Nobel de Economia.
Com seleção de boas frases dos especialistas, que traduzem de um jeito acessível aquilo que as pesquisas apontam, o documentário também mostra a formação das famílias atuais, que incluem casais homossexuais, a participação intensa de outras pessoas – avós e outros cuidadores – na vida da criança, e homens que assumem o protagonismo na criação dos filhos.
A importância da primeira infância é retratada e também fica latente o quanto isso não é considerado pela sociedade. “Cuidar do seu filho é considerado perda de tempo, é considerado um nada. E você está cuidando do futuro da humanidade!!!”, lembra bem uma das mães entrevistadas.
Deu pra entender porque tem dias que passo horas observando o que minha filha faz, como reage, em quais sons presta atenção… As crianças têm o dom de se encantar com pequenas trivialidades e estar com elas é redescobrir que o barulho de uma sacola vazia sendo amassada pode ser estarrecedor. Ou que amassar um pedaço de goiaba com as mãos pode ser muito prazeroso.
Fica evidente o quanto temos a aprender com ela, deixando de lado a presunção petulante de adultos detentores de conhecimento. Somos os responsáveis pelo futuro: por criar ou não quem, no futuro, vai bater panelas seletivamente, votar; respeitar os limites de velocidade no trânsito ou não, negar comida a quem tem fome ou não.
Obra indispensável para quem sonha e luta por uma sociedade mais igualitária.
O documentário está em cartaz nos cinemas e na plataforma VideoCamp.
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