A história do livro O Menino do Dedo Verde (escrito por Maurice Druon, em 1957) não ganhou os mesmos contornos de fama de O Pequeno Príncipe, mas merecia estampar produtos mil e arrancar suspiros assim como o menino no seu planetinha.
Tistu, o principal personagem do livro, tem o dom de fazer nascer flores em tudo que encosta. A expressão “dedo verde”, usada na jardinagem, diz respeito àquelas pessoas com dom para cuidar das plantas. No personagem, essa capacidade extrapolava o limite humano: era como um super poder.
O guri era tido como um esquisito. Não se encaixava em padrões e não ia bem na escola; dormia logo que o professor começava a falar, pois acha tudo muito maçante. Seus pais decidem que ele deve, então, sair do rumo tradicional e conhecer o mundo por conta própria, com os próprios olhos em vez de pelo que estava escrito nos livros.
Dessa maneira, Tistu ultrapassa o limite dos muros de sua casa – segura e impenetrável – e conhece a cidade, tem contato com a ‘desordem’.
Dessa maneira, Tistu ultrapassa o limite dos muros de sua casa – segura e impenetrável – e conhece a cidade, tem contato com a “desordem”. Conhece a rua, a favela, a prisão, o hospital; lugares feios e tristes onde há tristeza.
E não perde tempo: usa sua capacidade especial para tentar deixar tudo mais florido e, por consequência, bonito. Até a guerra Tistu foi capaz de reverter, quando transformou canhões em flores.
A história trata de convívio em sociedade, pincela nuances da desigualdade social, fala muito sobre ética e cidadania. A obra ainda questiona os padrões tradicionais de educação, que pode minar talentos. Escrita há quase 40 anos, a obra é considerada inovadora porque foi uma das primeiras a tratar sobre ecologia.
A fábula, singela e doce, pode ser comparada com a capacidade de qualquer criança. Todas nascem pequenas e olham com espanto para o mundo. Aos poucos, o olhar assustado se transforma em olhar de encantamento.
Alegoria
O brilho nos olhos das crianças é a capacidade de Tistu: olhar de um jeito para as coisas de forma a vê-las como coisas bonitas, sem o olhar engessado do adulto. O se divertir com o pouco, o riso que vem da simplicidade. Não esqueço o som das gargalhadas da minha filha se espalhando pelo corredor de um hospital enquanto brincava com uma cadeira de rodas. O dispositivo, geralmente associado à limitação, se transformou em um brinquedo divino aos olhos da pequena criatura.
Dizem que o mundo é dos espertos. Mas aprendi com minhas filhas a adotar a credulidade das crianças como forma mais agradável e menos dura de ver a vida: só assim podemos, quem sabe, deixar espaço para nossos dons de “dedos verdes” se manifestarem. Diante das estarrecedoras notícias do mundo real, o exercício de olhar como criança é capaz de deixar a vida mais leve e digna de ser vivida.
O MENINO DO DEDO VERDE | Maurice Druon
Editora: José Olympio;
Tradução: Dom Marcos Barbosa;
Tamanho: 128 págs.;
Lançamento: Outubro, 2016.
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