Na rua Mateus Leme, em Curitiba, uma construção que há mais de um século existe ali, e já foi casa de um dos mais emblemáticos artistas do Paraná, recentemente mudou de cara.
O Museu Casa Alfredo Andersen passou por uma grande reforma. Mudou toda sua roupagem interna e externa, sua proposta de expografia e curatorial e até sua identidade visual. Basicamente, quem visita o museu agora vê algo completamente novo, mas que ainda mantém a história que foi criado para conservar.
No dia 7 de dezembro a instituição reabriu ao público com duas exposições: “Alfredo Andersen in situ/ em trânsito”, de caráter mais permanente e que oferece um panorama da produção do artista norueguês; e “A razão da Paisagem”, de Geórgia Kyriakakis, como exposição temporária.
Vamos contar um pouco das novas propostas do Museu e Casa Alfredo Andersen e como as novidades relacionam-se com o passado do artista e da própria instituição.
Andersen em casa
O que chama atenção ao caminhar pelas salas, especialmente no andar térreo, são as soluções aplicadas em estruturas modernas e funcionais que, na exposição retrospectiva, ajudam a contar a história que a curadoria propõe.
Uma delas, a primeira a ser percebida depois da entrada, é a vitrine suspensa que se estende por diversas salas do andar térreo. Mesmo que enorme, ela agrega ao espaço de forma discreta, sem ser invasiva dentro das outras salas expositivas.
![Vitrine Suspensa Alfred Andersen](http://www.aescotilha.com.br/wp-content/uploads/2019/02/vitrine-suspensa-museu-alfredo-andersen.jpg)
Na exposição atual, os instrumentos de trabalho de Andersen se exibem na vitrine: pigmentos, paletas, lápis, bastões de giz, modelos. É bom lembrar que, antes da reforma, uma sala era utilizada no andar superior do museu para remontar o antigo ateliê do artista.
Outras estruturas também chamaram atenção, a exemplo da parede refletora com televisões embutidas. Nas telas, detalhes e informações preciosas sobre o trabalho de Alfredo.
![O novo Museu Casa Alfredo Andersen Museu Casa Alfredo Andersen](http://www.aescotilha.com.br/wp-content/uploads/2019/02/novo-museu-alfredo-andersen-1024x576.jpg)
No novo espaço do museu, a acessibilidade para deficientes visuais foi pensada através da instalação de sistemas de som que leem os textos das salas e etiquetas. Nada de fones de ouvido, apenas tubos metálicos que reproduzem as falas.
É visível a tentativa de preservar o lugar enquanto a casa que um dia foi, e também a necessidade de criar um espaço expositivo de características modernas. As parede que sustentam as obras são o maior exemplo disso: paredes falsas que permitem qualquer manipulação, qualquer furo, enquanto protegem a parede histórica que está por trás. Mesmo assim, permite-se ver um pouquinho do que ficou escondido por trás da superfície cinza.
![Museu Alfredo Andersen](http://www.aescotilha.com.br/wp-content/uploads/2019/02/parede-museu-alfredo-andersen.jpg)
In situ
De curadoria de Adolfo Montejo Navas e Eliane Prolink, a exposição “Alfredo Andersen: in situ/ em trânsito” se estende por todo o andar térreo e parte do primeiro andar do Museu. O nome da exposição refere-se à dupla condição de Andersen, de ser paranaense (in situ) e, ao mesmo tempo, um estrangeiro ainda muito ligado à velha pátria (em trânsito).
Olhando para diferentes aspectos e momentos da produção do artista, a exposição exibe parte de seu ofício, sua pesquisa, sua formação e seu cotidiano. E o mais interessante é como tudo isso é exibido para o público.
Os curadores aproveitaram a nova proposta de expografia e nomearam as salas de acordo com suas características de muitas décadas atrás, quando ainda era habitada por Andersen: “Sala 2 – Antiga sala de estar da casa”, “Sala 3 – Antigo quarto dos filhos”, “Sala 4 – Antiga cozinha”, e assim por diante.
![Sala expositiva do Museu Alfredo Andersen](http://www.aescotilha.com.br/wp-content/uploads/2019/02/sala-expositiva-museu-alfredo-andersen-1024x768.jpg)
O gênero de cada pintura em muitos momentos relaciona-se com a antiga função de cada ambiente. Na sala 2, por exemplo, as “obras em destaque”, do tipo que merecem a apreciação dos convidados que ficam na sala de estar. A sala 4, outrora cozinha, recebeu as “cenas de gênero, intimidade e fundo de quintal”, que são obras que falam do cotidiano.
O icônico “Entrada para Barra do Sul”, de 1930, que mostra o lado explorador da luz, possivelmente impressionista de Andersen, está entre os expostos (inclusive, na sala 2, salvo engano). Outro trabalho incrível, e que coloca Andersen em consonância com outros grandes nomes da arte brasileira daquele tempo, é “Duas Raças”, também de 1930.
Cortando a maior parte das salas do andar térreo está a vitrine suspensa contendo os itens de trabalho do velho mestre. Antigos pincéis, tintas e materiais de rascunho se colocam em contato com a produção.
Em trânsito
No andar superior está a sala ateliê, extensão temporária da exposição que inicia no andar abaixo. A sala era o local exato onde, décadas atrás, Andersen recebia seus alunos e amigos da arte, além de ser seu local de trabalho.
Nela, conhecemos outros aspectos da vida de Andersen como artista. Enquanto o andar térreo expõe seus trabalhos finais, este ambiente nos revela seu processo e, segundo os curadores, também a sua condição de artista estrangeiro.
O novo Museu Casa Alfredo Andersen parece justamente olhar para os vários momentos, facetas e investidas do artista que homenageia. Exibe-o como pesquisador, como capaz de alterar-se, não apenas como figura intocável.
Não à toa, na sala estão expostos esboços, fotografias da juventude, velhos livros e publicações que vieram de longe. Até registros de venda de obras é possível encontrar entre os documentos levantados.
Ali está exposto não apenas o Andersen produtor de grandes obras, mas também o profissional, o cidadão, o estudioso, o familiar.
Também estão expostos trabalhos que fizeram Andersen explorar seu gênio pesqusiador. São 4 pinturas de paisagens, o gênero principal utilizado pelo artista para estudar os efeitos da luz.
Dentre as pinturas está o famoso “Porto de Paranaguá”, de 1918, em que, segundo os curadores, “a neblina e a luz construída de brancos desmancham o horizonte e o próprio contorno retangular da tela…”
!["Porto de Paranaguá", de Andersen, 1930 Alfredo Andersen - Porto de Paranaguá](https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/1/19/Alfredo_Andersen_-_Porto_de_Paranagu%C3%A1%2C_s.d..jpg)
Novas paisagens
Uma das propostas que surge com o novo Museu é a de uma Sala Rotativa para realizar exposições temporárias com artistas contemporâneos que possuam uma produção que, de alguma forma, se relacionem com a prática de Andersen.
É daí que aparece a exposição “A razão da Paisagem”, de Geórgia Kyriakakis. Artista paulista, Geórgia explora em seus trabalhos a paisagem não apenas como uma questão de um lugar que está além, mas também como um problema físico, de quantidade, volume, deslocamento, balanço.
Fotografias e instalações fazem parte da mostra do trabalho da artista que ocupa uma sala não muito maior que 30 metros quadrados, preenchidas com 4 ou 5 obras.
Exibir trabalhos que tomam a paisagem como um problema a ser explorado é bastante interessante. Foi através do gênero da paisagem que, na pintura, Andersen estudou a fundo as possibilidades das técnicas, materiais e composições.
Com propostas assim, as produções de conectam e se referenciam. As obras de Andersen não ficam sendo um período passado, mas um ponto de contato com o presente.
![Museu Alfredo Andersen Geórgia Kyriakakis](http://www.aescotilha.com.br/wp-content/uploads/2019/02/Alfredo_Andersen-Georgia_Kyriakakis-1024x768.jpg)
Durante sua vida, Alfredo Andersen foi proclamado por muitos de seus alunos, admiradores e conterrâneos como o “pai da arte paranaense”.
Sem negar o quão importante foi a atuação do artista norueguês por aqui, a historiadora Maria José Justino (1995) diz que o título de “pai” não é totalmente justo, já que ignora “a travessia” do artista, seus anos e práticas de pesquisa.
O novo Museu Casa Alfredo Andersen parece justamente olhar para os vários momentos, facetas e investidas do artista que homenageia. Exibe-o como pesquisador, como capaz de alterar-se, não apenas como figura intocável.
Além de tudo, como instituição, parece querer localizar a produção de Andersen dentro do presente, relacionando-a com outras produções contemporâneas, sem esquecer do valor da sua história.
SERVIÇO | Museu Casa Alfredo Andersen
Quando: aberto de Terça a Sexta, das 9h – 18h; Sábado e Domingo, das 10h – 16h;
Onde: Rua Mateus Leme, 336, Curitiba/PR;
Quanto: Gratuito.