Em um país com o mínimo de regras (cumpridas, não meramente estabelecidas), cronistas não sairiam de férias – muito menos seriam demitidos. Trata-se de uma lógica bem simples: quem além destes nobres seres que se debruçam sobre a cotidianidade seria capaz de promover o equilíbrio do universo com narrativas sobre, ahn, digamos, o nada?
A crônica caminhou um longo trajeto: de maltratada a fundamental à nossa existência. No meio do caminho, foi preciso que derrubássemos preconceitos – e algumas barreiras de estilo, por que não? A verdade é que nós, os cronistas, abrimos espaço em meio a gigantes, até que assumíssemos a figura de um destes. Sim, tão grande quanto a gama de assuntos que nossas linhas permitem é o nosso ego. Só isso explica a quantidade de textos sobre, ahn, digamos, nós.
A verdade é que nós, os cronistas, abrimos espaço em meio a gigantes, até que assumíssemos a figura de um destes. Sim, tão grande quanto a gama de assuntos que nossas linhas permitem é o nosso ego.
Convido o leitor a refletir sobre o assunto. O O Globo não fica mais digerível uma vez por mês com a nova coluna de Milton Hatoum? Às terças-feiras, Curitiba não fica menos cinza e a Gazeta do Povo até mais plural com as linhas de Luis Henrique Pellanda? Ao menos, eu esqueço que Constantino faz parte do mesmo jornal. Veríssimo também aliviou a barra da Zero Hora. Mais recentemente, Cristovão Tezza, um daqueles raros gênios da raça, fez com que eu readquirisse o prazer de ler a Folha de São Paulo aos domingos, pelo menos um domingo sim e outro não.
De fato, em alguns momentos, considero que a classe dos cronistas precisaria de alguns limites, coisas simples, pequenas normas de conduta. Da mesma forma que nossa ausência pode criar o caos, nossa presença também é capaz de evocar as trevas. Não consigo pensar o Brasil fora da narrativa em que Gregório Duvivier e Pondé não tenham aberto uma fenda no espaço-tempo e jogado o país neste eterno sete-a-um. Sim, para cada Rubem, Sabino, Nelson e Cecília, precisamos enfrentar o dissabor de um Arnaldo, o Jabor – que é para rimar.
Na impossibilidade de impedir que cronistas saiam de férias – ainda que, para o bem geral da nação, haja um certo grupo de nobres deputados e senadores contornando esse sacrilégio –, criamos a função de cronista tapa-buraco, muito a contragosto do sindicato dos cronistas. Por isso, pensando unicamente na manutenção do equilíbrio e bem-estar da nação, retomo este espaço durante o mês de férias de Yuri Al’Hanati. Afinal de contas, alguém precisa seguir falando sobre o nada ou sobre si.