Política é um negócio muito doido. Tão doido, difícil, complicado e necessário que durante mais de duas décadas ficamos privados de parte de seu exercício. Parte porque política não se resume ao voto. Fazer política é um exercício cotidiano, atrelado ao pensar, ao agir e a tantos outros verbos. Falar sobre cultura e políticas culturais, por exemplo, é um exercício político. Um filme, uma peça teatral, uma música também são. Enfim, política não foge de nós em nenhum instante.
Essa afirmação é tão verdadeira que existem na Câmara dos Deputados, vejam só, a bancada evangélica e a bancada da arma. Não que estejam dissociadas, afinal, a bíblia nas mãos erradas também é uma arma. A questão é que política é, em primeira e última instância, um exercício de poder. Por isso, por exemplo, fala-se tanto que o PT possui um plano de poder e não um plano de governo.
Acontece que aquelas mais de duas décadas ceifadas de nosso imaginário criaram um vazio, um lapso que nunca preenchemos. Primeiro, porque não há interesse do poder público em que você aprenda e domine a política em todos seus níveis. E isso vale para o mundo todo, ok? Esqueça aquilo de que “time is money“. Essa é a maior mentira do mundo. Poder é dinheiro e dinheiro é poder, não existe “tempo” nesta equação.
Poder é dinheiro e dinheiro é poder, não existe ‘tempo’ nesta equação.
Digamos que a política é o jazz no ato cívico da vida e, bem, não sei você, mas é mais fácil aprender violão e montar uma dupla sertaneja do que enfrentar um trompete e ser o novo Miles Davis. Concorda? Se concordou, acaba de justificar a segunda razão para não preenchermos esta lacuna: nosso próprio desinteresse. Política não é tão simples. Ela não vem mastigada ou pronta para servir. Ela exige leitura, dedicação, compreensão e outros valores muito mais importantes que os da família brasileira, aquela do comercial de margarina.
Acontece que não nos ensinaram a ter prazer em falar sobre a bendita. Pior, não nos ensinaram a leitura crítica da mídia, o grande poder nas sociedades emergentes. Sim, cara pálida. Não é papo de bolivariano comunista petralha. A comunicação é uma forma enorme de poder. E não só a imprensa, a publicidade também, quiçá muito mais. Eu, por exemplo, tinha na faculdade uma matéria chamada Opinião Pública e Propaganda. Nela, desenvolvíamos habilidades para, no bom português, manipular a opinião pública. Óbvio que nada poderia fugir da ética. Publicitária, é claro. Cof! Cof!
Aí, como se fossemos uma cidade do SimCity, acreditamos que administrar um país e seus recursos é como o conceito do jogo. Faz umas usinas de energia aqui, delegacias de polícia ali, umas indústrias acolá, um par de avenidas rasgando o mapa inicialmente verde de ponta a ponta, do jeito que der. E se não der, espera chegar no nível avançado e faz o Maluf: constrói uns elevados. Vai surgir uma manifestação aqui vez ou outra, mas nada que atrapalhe o andar da carruagem. E se um dia nos cansarmos é só chamar um desastre e por tudo no chão. Mas essa é a única evolução que a Electronic Arts ainda não trouxe para o mundo real. Até lá, vamos levando e engolindo a Xuxa falando sobre política.