A imortalidade é um desejo que não morre nunca, né? Entra ano, sai ano e sempre tem alguém tentando dar um jeito de não bater as Havaianas nunca, não sei se por cagaço de morrer de um jeito dolorido e degradante, ou se por alguma reunião muito importante, que por causa da correria acabou sendo agendada pra depois dos 100 anos.
Como a criogenia dos filmes de ficção científica não é um negócio muito acessível e ainda não foi disponibilizada pelo SUS, o pessoal precisou dar os seus pulos pra conseguir durar pra sempre e aí inventaram as academias. Todo mundo que entra ali aparentemente tem pavor de morrer. Não tanto por ter que largar os betes da existência, mas principalmente pelo importante desfalque que o universo teria que enfrentar em caso de suas ausências.
Tanto na academia de letras quanto na academia que não é de letras as pessoas costumam se vestir de maneira meio ridícula, mas há um consenso de que não pega bem rir do fardão ou da camiseta regata do fortão, por mais que seja bem difícil levar a sério alguém vestido assim. Esta quebra de padrões cotidianos de vestuário visa angariar mais olhares de seus pares para que se estabeleça uma demarcação de território que prima pela exibição estética e abdica da urina, que costuma ser mais convencional e socialmente mais bem aceita num protocolo canino.
É na pausa do discurso e no intervalo entre uma série e outra de abdominais que os imortais refletem sobre as grandes questões da humanidade: ‘será que estou vivendo, ou apenas existindo?’.
Tanto o intelectual que palestra sobre sua própria obra, quanto o sujeito que geme alto no leg press, anunciam para o mundo a boa nova: eles pretendem durar pra sempre.
É na pausa do discurso e no intervalo entre uma série e outra de abdominais que os imortais refletem sobre as grandes questões da humanidade: “será que estou vivendo, ou apenas existindo?”, “Há vida após a morte mesmo quando não há morte?”, “misturar purê de batata doce com whey protein dá caganeira?”.
Amantes de espelhos, sejam eles feitos de admiradores com baixa autoestima ou desses mais comuns feitos com prata e vidro, os imortais gostam de exibir sua infinitude fazendo poses cuidadosamente coreografadas para parecerem naturais. Truques como citar intelectuais desconhecidos ou fingir que está trocando uma lâmpada já caíram em desuso, hoje em dia costuma-se citar frases profundas que por acaso foram escritas por você mesmo ou simplesmente fingir que está alongando como se estivesse no Circo de Soleil, em todos os casos percebe-se uma tentativa de deixar clara que na verdade eles não sentem tesão pelo seus próprios reflexos. Jamais, nem pensar, credo.
Enfim, em meio a esta ânsia de permanecer existindo por tempo indeterminado, através de musculaturas e sapiências arduamente modeladas, é possível que os destinos e as vaidades destas duas academias acabem por se cruzar um dia (afinal, tem tanto escritor sedentário e tanto personal trainer com dicas para vencer na vida), mas não sei exatamente onde e quando isso deve acontecer, pode ser tanto numa visita ao cemitério, quanto no intervalo de uma rosca invertida.