Um velhinho meio encurvado no meio do corredor da praça de alimentação atrasa o movimento das bandejas engorduradas que vem e vão, sempre com pressa.
Parece procurar uma moeda que caiu, mas não é nada disso: é a coluna destroçada. Escoliose, lordose, sabe-se lá. Ele só quer ir ao banheiro.
A criançada que estuda no colégio ao lado do shopping vem vindo lá no fundo. Elas apontam e riem e imitam e saboreiam a impunidade da crueldade infantil.
As senhas das lanchonetes não param de apitar suas urgências sequenciadas. Ninguém consegue ouvir a música ambiente. Nos televisores espalhados pelas paredes, as últimas promoções que nunca acabam.
Os estudantes ainda estão rindo da coluna do velhinho e as pessoas ao redor começam a se incomodar, mas só que lentamente, com gestos prolongados, como se estivessem acordando de uma boa noite de sono.
Então o pequeno neto se levanta da mesa em que está a família, vai até o avô, segura o seu braço com delicadeza e o conduz até o banheiro, abrindo espaço e olhando feio para a piazada que agora finge constrangimento.
Os estudantes ainda estão rindo da coluna do velhinho e as pessoas ao redor começam a se incomodar, mas só que lentamente, com gestos prolongados, como se estivessem acordando de uma boa noite de sono.
O fluxo no corredor normaliza e segue sua anormalidade rotineira.
Logo depois o garoto volta sozinho e se senta à mesa.
Passam-se alguns minutos até que o velho apareça novamente no mesmo corredor, em sentido contrário. Passos lentos, bem lentos. Por sorte os estudantes já se foram.
Aproxima-se da mesa do netinho. Está na cara que a família vai se levantar e ajeitar a cadeira para que ele possa se sentar, mas ele não para, segue em frente e vai embora sozinho.
A família continua almoçando normalmente. O menino sorriu para o velhinho quando ele passou.
Os dois nem se conheciam.