• Sobre
  • Apoie
  • Política de Privacidade
  • Contato
Escotilha
Sem Resultados
Veja Todos Resultados
  • Reportagem
  • Política
  • Cinema
  • Televisão
  • Literatura
  • Música
  • Teatro
  • Artes Visuais
  • Reportagem
  • Política
  • Cinema
  • Televisão
  • Literatura
  • Música
  • Teatro
  • Artes Visuais
Escotilha
Home Crônicas Eder Alex

Respirar

porEder Alex
11 de novembro de 2016
em Eder Alex
A A
"Respirar", crônica de Eder Alex.

Imagem: Reprodução.

Envie pelo WhatsAppCompartilhe no LinkedInCompartilhe no FacebookCompartilhe no Twitter

Tennessee Williams tem um conto chamado “Areia”, que fala sobre um casal de velhinhos vivendo sozinhos há algumas décadas. Ele sofreu um AVC e ficou com algumas sequelas, então ela se sente muito angustiada o tempo todo, pois teme que ele piore e a deixe sozinha. Tomada por muita ansiedade, ela passa a reparar nos sons que o marido faz, dobrando o jornal, por exemplo, enquanto ela não está no mesmo cômodo que ele. Ela interrompe o que está fazendo, fica em silêncio, e quando ouve os sons que lhe são tão familiares, sente-se aliviada. O mesmo ocorre quando acorda à noite e tenta identificar se ele ainda está respirando.

Li esse conto há vários anos (senti um nó na garganta na primeira vez e nas releituras me contentei em apenas ficar com os olhos marejados) e desde então ele sempre me vem à mente de forma meio aleatória, em dias inesperados, mas em geral ele dá às caras lá no fundo da memória quando ando angustiado.

E o que me toca e me destrói ali naquela história, de verdade, é a velhinha conferindo se o velhinho está respirando. O movimento do lençol, o peito se mexendo, o alívio. Tudo ainda está como antes. Mas por quanto tempo?

A areia ali do título se refere a uma viagem à praia que o casal fez durante a lua-de-mel há muitas décadas e também, obviamente, à passagem de tempo numa ampulheta. E o que me toca e me destrói ali naquela história, de verdade, é a velhinha conferindo se o velhinho está respirando. O movimento do lençol, o peito se mexendo, o alívio. Tudo ainda está como antes.

Mas por quanto tempo?

Já fiz dessas. Em filme, vi utilizarem um espelho pra ver se ele fica embaçado, mas quando criança eu apenas colocava a mão perto do nariz da pessoa pra conferir se ela ainda estava respirando. Um medo lazarento de perder as pessoas que amo.

Se todos estão respirando, então está tudo ok, as coisas estão em seus devidos lugares.

Mas não estão, não é mesmo? A vida tá foda pra todo mundo.

Hoje a gente não respira em grupo, então quase ninguém percebe a asfixia do outro. No atropelo do dia a dia, somos apenas competidores num concurso de apneia meio triste e um tanto enlouquecido. Ali naquele meio tempo entre a porra do caixa eletrônico que não reconhece a sua biometria nem o código de barras da fatura e a briga idiota à noite, antes de dormir, entre pessoas que se amam e não se falam, deve haver um momento, um minuto que seja com a cabeça colada no vidro do ônibus imaginando que está num filme indie, em que alguém consegue ficar em silêncio e reparar: respiração.

Pausa. Ponto. Parágrafo. Respira. Calma.

O movimento do lençol, o peito se mexendo, o alívio.

Ok, isso talvez não resolva nada, mas pode ser que possibilite colocar todo esse nada em ordem e, quem sabe, também faça com que ninguém tenha que apelar para nenhum texto estilo carpe diem escrito por alguém iluminado por Cronos que explica tim-tim por tim-tim como é bonito parar o tempo numa segunda-feira e reparar na beleza do mundo enquanto no fundo, no fundo um dia de merda passa em fast forward diante dos seus olhos.

Nenhuma segunda-feita é feita para amadores. Por escrito, a angústia cotidiana pode até ser poética, mas no peito, em meio à fuligem dos escapamentos de uma capital ecológica, ela queima de forma insuportável.

Lá no conto, a velhinha, profundamente angustiada, sente que a vida parou, como se eles estivessem fazendo uma pose para um fotógrafo que não está lá para capturar e eternizar toda aquela terrível solidão.

Aparentemente naquela época não existia selfie.

Tags: CotidianorespiraçãorespirarselfietempoTennessee Williams

VEJA TAMBÉM

ruído
Eder Alex

Ruído

2 de junho de 2017
"Dois amigos", crônica de Eder Alex.
Eder Alex

Dois amigos

26 de maio de 2017
Please login to join discussion

FIQUE POR DENTRO

Exposição ficará até abril de 2026. Imagem: Gabriel Barrera / Divulgação.

Exposição na Estação Luz celebra a Clarice Lispector centenária

8 de maio de 2025
Grupo indiano chega ao Brasil com disco novo, em parte de extensa turnê de lançamento. Imagem: Tenzing Dakpa / Divulgação.

C6 Fest – Desvendando o lineup: Peter Cat Recording Co.

8 de maio de 2025
O escritor José Falero. Imagem: Reprodução.

Contundente e emocionante, ‘Vera’ evidencia a alta qualidade da literatura de José Falero

7 de maio de 2025
Jesuíta Barbosa encarna Ney Matogrosso na cinebiografia do cantor. Imagem: Paris Filmes / Divulgação.

‘Homem com H’ revela a insurgência de Ney Matogrosso sem recorrer a mitificações fáceis

7 de maio de 2025
Instagram Twitter Facebook YouTube TikTok
Escotilha

  • Sobre
  • Apoie
  • Política de Privacidade
  • Contato
  • Agenda
  • Artes Visuais
  • Colunas
  • Cinema
  • Entrevistas
  • Literatura
  • Crônicas
  • Música
  • Teatro
  • Política
  • Reportagem
  • Televisão

© 2015-2023 Escotilha - Cultura, diálogo e informação.

Sem Resultados
Veja Todos Resultados
  • Reportagem
  • Política
  • Cinema
  • Televisão
  • Literatura
  • Música
  • Teatro
  • Artes Visuais
  • Sobre a Escotilha
  • Contato

© 2015-2023 Escotilha - Cultura, diálogo e informação.