Finalmente chegou o grande dia: amigo secreto da empresa. Era a vez da Letícia.
– Gente, eu não vou descrever, vou falar direto quem é porque…
Foi cortada por um coro de funcionários: “nããããão”.
– Eu não gosto dessa brincadeira, desculpa, quero acabar logo com isso. Não tenho intimidade com a pessoa que eu tirei.
Os colegas seguiam gritando, “descreve logo!”, “para de frescura!”, “que mulher chata!”, “TPM!”.
– Tá bom, vocês querem que eu fale?
O coro dos empolgados voltou: “siiiim”. Eles não eram maioria, no geral as pessoas estavam constrangidas ou pensando em simular um desmaio.
– Tudo bem, vocês que pediram.
Os funcionários aplaudiram.
– Meu amigo secreto é feio.
O silêncio tomou conta do refeitório.
Eu não gosto dessa brincadeira, desculpa, quero acabar logo com isso. Não tenho intimidade com a pessoa que eu tirei.
– Eu não sei mais nada sobre ele, só sei que é feio de doer. Quando eu disse que não queria participar, ele foi um dos que mais me encheu o saco – mesmo que a gente nunca tivesse trocado uma palavra. Ele passava na minha mesa pedindo meu nome pra colocar no sorteio, eu dizia que não queria e ele ficava um tempão falando que eu ia ser muito mal vista na empresa e que a minha imagem era tudo aqui.
As pessoas olhavam umas para as outras, algumas cochichavam.
– Acontece que, além de feio, ele tem bafo! E daí um dia eu não aguentei, falei: coloca logo o meu nome nessa porra. Porque eu não queria ter que participar de mais uma conversa com aquele ser, queria que ele parasse de chegar perto de mim e me deixasse em paz, sem ter vontade de vomitar.
Alguns colegas colocaram a mão na boca para segurar a risada.
– Então eu entrei e logo que vi quem eu tinha tirado e o valor do presente, já me arrependi. A partir de cem reais, galera? Cem? Sério? Cem reais pra comprar presente pra uma pessoa baforenta que nunca me falou um “bom dia”? Coloca a mão na consciência! Essa empresa tem 560 funcionários, esse departamento tem 78 e eu falo com três! Quem não é da minha baia nem sabe que eu existo, garanto que ninguém aqui sabia o meu nome até hoje.
Uma mulher da frente falou “Vixe!” bem baixinho.
– Não, não é Vixe, é Letícia. Estão vendo?
Os cochichos aumentaram.
– E aí, vão querer adivinhar quem é ou não? Posso falar de uma vez o nome e voltar a trabalhar?
Ninguém respondeu.
– Bom, então é isso.
“Jeremias!”, gritou uma voz ao fundo. Outras pessoas tomaram coragem e começaram a gritar também, “Jeremias! Jeremias! Jeremias!”.
– Tá, é isso. Felizes?
Jeremias se levantou e foi sorrindo buscar o seu presente. Letícia entregou e não esperou para sair na foto.