O perfeccionismo é uma das “qualidades” mais assustadoras que alguém possa ter. Como a realidade, em seus mais ínfimos detalhes, me parece defeituosa, repleta de falhas, ainda que bela, quando não sublime, esperar o incorrigível mais parece um transtorno, uma anomalia, do que algo digno de orgulho. Mas isso é apenas um ponto de vista, passível de discussão.
Tenho séria suspeita de que sofro de um certo déficit de atenção, algo leve o suficiente para que nunca tenha sido diagnosticado por médicos, mas tão evidente para mim, que nem preciso recorrer a um parecer profissional. Já cumprimentei manequins de loja, pedi licença a samambaias, peguei ônibus em sentido errado, esqueci casacos, óculos, guarda-chuvas e pacotes de presente nos lugares mais improváveis. Muitas vezes consegui reverter essas perdas, talvez graças às bençãos do que chamo o Deus do Acaso, um aliado velho de guerra, talvez também partidário da imperfeição.
Em minha defesa, evoco uma das muitas frases (e também título de uma de suas obras) mais singelas e potentes do poeta curitibano Paulo Leminski: “Distraídos, venceremos!”.
O perfeccionismo é uma das ‘qualidades’ mais assustadoras que alguém possa ter. Como a realidade, em seus mais ínfimos detalhes, me parece defeituosa, repleta de falhas, ainda que bela, quando não sublime, esperar o incorrigível mais parece um transtorno, uma anomalia, do que algo digno de orgulho. Mas isso é apenas um ponto de vista, passível de discussão.
Por outro lado, orgulho-me, em certa medida, de minha memória. Não à toa uma de minhas amigas mais queridas me chama de “embaixador do passado”, porque costumo lembrar senão de tudo, mas de muito, desde frases inteiras, em conversas travadas há décadas, olhares, nomes, datas, amores, dores e festas. Talvez porque viver para mim, desde menino, nunca tenha sido algo completamente banal. Sempre levei, da minha forma avoada, tipicamente desligada de pisciano, a vida muito a sério. Qualquer dia pode ser o último. Então que tudo seja verdadeiro, intenso.
Não acredito, assim, muito em perfeccionismo, porque, me parece uma tentativa inócua de alguém colocar uma ordem no mundo, quando a sua alma pode estar de pernas para o ar, mergulhada no caos. Creio que a imperfeição é bem mais instigante, pois nos desafia a entrarmos, e nos mantermos, em movimento, mas sempre com direito à contemplação, a uma parada para mergulhar na paisagem.