Nossos telefones celulares andam repletos de fotos. Elas ocupam uma parte substancial da memória dos aparelhos, mas, ironicamente, lá ficam esquecidas, empilhadas como caixas de uma mercadoria que ninguém quer comprar, no estoque de uma loja. Tornam-se fantasmagóricas nessa triste condição de, ao mesmo tempo, excesso e banalização.
Se há hoje a facilidade tecnológica de reunir em um único aparelho tantas funções, e o registro de todo e qualquer instante está sempre ao alcance das pontas dos dedos, parece que esses registros valem menos. Ficam estocados, mas de certa forma, esvaziam-se de sentido por conta da fragilidade inevitável do que se torna fácil demais.
Nossos telefones celulares andam repletos de fotos. Elas ocupam uma parte substancial da memória dos aparelhos, mas, ironicamente, lá ficam esquecidas, empilhadas como caixas de uma mercadoria que ninguém quer comprar, no estoque de uma loja.
Devolver imagens à materialidade do papel, as regatando do exílio digital, onde permanecem em estado de incômoda latência, distante dos olhos e, portanto, longe do coração, talvez seja um ato de rebeldia. Não contra as comodidades inegáveis da tecnologia, mas a favor de nossas narrativas, hoje tão fragmentadas e, portanto, mais efêmeras, e carentes de consistência, essência.
A memória, percebo com o passar dos anos, é uma alameda a ser percorrida a pé e não uma highway, destinada a máquinas velozes e furiosas. Se o tráfego estiver sobrecarregado, ou a rapidez for a regra, tudo passará rápido demais e o esfacelamento inevitável. Paisagens, rostos, experiências se desmancharão em pixels acumulados, na ilusão de um resgate eventual, que por vezes jamais chegará.
Seremos nuvens passageiras. Por isso, retornar ao papel talvez possa nos devolver à saudade que se toca, e guarda. Nas paredes, em álbuns, ao alcance do corpo e da alma.