Espio pela janela e vejo a moça sentada no banco da praça. Olhar distante, quase ausente, como se apenas seu corpo estivesse ali, como um detalhe da paisagem. Ela não vem todos os dias. Às vezes, passa semanas sem aparecer. Até quase sumir da memória. E, de repente, ressurge, no mesmo lugar, mas em diferentes horários. No início da tarde, logo após o almoço, ou mesmo no cair da noite, quando as ruas ao redor estão repletas de carros, buzinas, ansiedade crepuscular.
O olhar da moça não muda. Por vezes tem um livro nas mãos, mas não a vejo lendo. Ela o segura com convicção, os dedos entre as páginas para, talvez, marcar onde interrompeu a leitura. Os pés, em sapatos sem salto, sempre pretos, ficam muito juntos, alinhados, na iminência de um levantar-se, de fugir. A ausência que se vê em seus olhos denunciam que ela, por mais que insista em reaparecer, é transitória. Uma espécie de miragem prestes a desmanchar-se no ar.
O olhar da moça não muda. Por vezes tem um livro nas mãos, mas não a vejo lendo. Ela o segura com convicção, os dedos entre as páginas para, talvez, marcar onde interrompeu a leitura.
Os solitários são intrigantes. Nunca a vi falando com ninguém, nem mesmo olhando a tela de um celular. É possível que sequer possua um aparelho. Difícil imaginá-la trocando mensagens, navegando pelas redes sociais. Não parece pertencer a este tempo, com suas saias longas, de diversas cores, à altura dos tornozelos, que lhe emprestam um ar de heroína trágica, Será que todos a veem assim, ou é apenas minha imaginação que, diante de sua presença lacunar, inventa narrativas, para dar a ela algum sentido?
Outro dia, do alto, a vi partir, perto do fim da tarde. Levantou-se do banco em um movimento lento, elegante, com os pés sempre juntos. Os cabelos castanhos escuros, lisos, à altura do ombro, transformaram-se em um coque num único gesto convicto. Vi seu pescoço esguio, delicado. Ela olhou para o céu invernal, cinzento e coalhado de nuvens. Por um instante, fechou os olhos e, quando os reabriu, vi alguém que nunca tinha enxergado antes, para depois sumir entre os carros.