Temperaturas muito elevadas podem deprimir curitibanos, talvez não todos, mas aqueles que se sentem de alguma forma traídos pelas condições climáticas contrárias a seus organismos nublados. Se o termômetro marca acima dos 30 graus, percebem-se nas ruas olhares cúmplices de discreta angústia, sobretudo nestes dias mascarados, quando quase tudo precisa ser dito entre um e outro piscar. O suor escorre pela testa e o ar quente, bloqueado pelo tecido protetor, torna a experiência toda ainda mais desoladora, muito próxima a uma tortura úmida e silenciosa.
Na última sexta-feira, ouvia-se no Centro um som perturbador a circular: prematuras cantilenas de Natal, mas em versões instrumentais e com direito a harpas, cuja sonoridade deveria, em teoria, ser angelical, mas acabou tendo sobre meus tímpanos o efeito de pregos diabólicos. Bateu na hora uma sensação de desespero, como se um despertador amplificado tivesse disparado a anunciar o fim de um ano que sequer começou, em pleno início de outubro.
O que fazer com 2020, a menos de três meses de seu fim? Essa é uma pergunta que muitos devem estar se fazendo, enquanto continuam a simular uma necessária, ainda que precária normalidade. Estimular nas pessoas o espírito natalino me parece, a esta altura, um ato extremo, ainda que compreensível, para recuperar as perdas acumuladas em decorrência da pandemia.
O que fazer com 2020, a menos de três meses de seu fim? Essa é uma pergunta que muitos devem estar se fazendo, enquanto continuam a simular uma necessária, ainda que precária normalidade. Estimular nas pessoas o espírito natalino me parece, a esta altura, um ato extremo, ainda que compreensível, para recuperar as perdas acumuladas em decorrência da pandemia. Minha racionalidade, contudo, não vai tão longe ao ponto de aceitar passivamente a violência de um “Jingle Bells” fora de época. Ir às compras quando ainda há gente agonizando em leitos de hospitais no Brasil, e mundo afora, me parece obsceno.
Enquanto isso, o calor segue martelando. É quase audível em sua desfaçatez. “Virem-se”, parece dizer, enquanto uma nova sessão de cantigas natalinas não se inicia. A vontade, confesso, é de acordar no segundo semestre de 2021, em um mundo vacinado, livre da Covid-19 e, quem sabe, de outros flagelos herdados deste ano. Até lá, aguardo um pé de vento, uma brisa que refresque um pouco estes tempos quentes de incerteza e, curitibanamente, rezo por um dia frio e nublado.