Seis meses. Meio ano. Uma fração maior ou menor da vida, a depender do quanto ela durar. O dias têm passado até bem rápido, apesar de muitas vezes parecerem absurdamente iguais, repetitivos. A turbulência do mundo lá fora compensa essa aparente pasmaceira: pandemia, incêndios destruidores, escândalos políticos, lives musicais, discursos autoritários e desdenhosos, carreatas, bateção de panelas, eleição e muitas, muitas mortes. O noticiário nunca pareceu tão distópico, quase apocalíptico.
É constante a sensação de perigo à espreita, de que algo muito ruim anda prestes a acontecer, a despeito da calmaria que reina entre as paredes deste refúgio que eu chamo de lar – um apartamento no Centro de Curitiba, onde me surpreendo acordando mais cedo, antes do amanhecer, para ouvir as sabiás anunciando o novo dia. Daí percebo o quanto a esperança é sedutora, e quase ingênua.
A turbulência do mundo lá fora compensa essa aparente pasmaceira: pandemia, incêndios destruidores, escândalos políticos, lives musicais, discursos autoritários e desdenhosos, carreatas, bateção de panelas, eleição e muitas, muitas mortes. O noticiário nunca pareceu tão distópico, quase apocalíptico.
Há tantos paradoxos sobre os quais refletir. Nunca me senti tão ameaçado e ao mesmo tempo circunstancialmente protegido. como se estivesse em um bunker simbólico mais do que físico. Posso sair quando bem entender porque não há bombas caindo do céu. O inimigo principal, ou ao menos o mais óbvio deles, é invisível. Pode ou não estar no ar, nos corrimões e portas que toco, na respiração de quem nem conheço. Mas há outros.
É difícil prever como iremos nos lembrar destes tempos estranhos em que muitos de nós fomos forçados a olhar para dentro de nossas vidas, de nós mesmos. Às vezes tudo parece um longo sonho intermitente, do qual acordo e no qual volto a mergulhar. Se olho para trás, dias, semanas e meses se embaralham, como se já não obedecessem uma linha cronológica evidente. O tempo parece ter silenciosamente descarrilado.
Prefiro, então, talvez seduzido, em minha insistente ingenuidade, pela esperança, olhar para frente. Imaginar reencontros, madrugadas etílicas regadas a música e conversa, viagens que ainda farei, Sinto-me quase tolo, mas não faz mal. Melhor assim.