A primeira vitrola que eu tive era portátil, estilo malinha, de plástico bege e vermelho, e me foi dada de presente de aniversário quando tinha uns 9, 10 anos. Por mais simples e rudimentar que o aparelho fosse, para mim era a coisa mais linda deste mundo porque sempre fui apaixonado por música. Lembro-me de só conseguir estudar para provas, ou mesmo ler e escrever, ao som dos discos que, desde aquela época, fui colecionando de forma quase obsessiva, não sem a influência de meus pais, também bastante musicais, cada um com seus gostos ao mesmo tempo particulares e ecléticos. Cresci ouvindo um pouco de tudo, de Jamelão a Frank Sinatra, passando por Ray Conniff, Maysa, Stevie Wonder e Maria Bethânia, às vezes no mesmo dia.
Além dos tradicionais compactos simples de vinil colorido com histórias infantis, que como toda criança eu ouvia sucessivamente até decorar quase todas as falas e narrações, um dos primeiros álbuns adultos que me chegaram às mãos, pouco depois de ganhar o toca-discos, foi Love to Love You, Baby (1974), segundo LP da rainha disco norte-americana Donna Summer, produzido na Alemanha por Giorgio Moroder e Pete Belotte. A faixa-título, com inacreditáveis 16 minutos e 50 segundos de duração, ocupava todo o lado A do vinil e, no Brasil, com dois anos de atraso, virou tema da novela Anjo Mau, de Cassiano Gabus Mendes, estrelada por Suzana Vieira e José Wilker.
“Sabia que essa faixa aí tem 23 orgasmos, contados nos dedos?”, perguntou aos sussurros e entre risos uma vizinha de prédio, quando, ao entrar em nosso apartamento no Rio de Janeiro, me ouviu ouvindo o LP. Meio sem jeito, minha mãe saiu do meu quarto, desconversou, mas não conseguiu evitar outra pergunta, essa vindo de mim, algumas horas mais tarde, quando estávamos a sós: “O que é um orgasmo?”, disparei à queima-roupa.
A música acabou se tornando, também por aqui, um baita sucesso nas rádios e nas pistas de dança, preparando o terreno para os dancin’ days e embalos que estavam por vir. E, claro, virou, assunto das conversas à meia-voz entre adultos, em tempos bicudos de proibição pela censura brasileira de O Último Tango em Paris e Laranja Mecânica.
“Sabia que essa faixa aí tem 23 orgasmos, contados nos dedos?”, perguntou aos sussurros e entre risos uma vizinha de prédio, quando, ao entrar em nosso apartamento no Rio de Janeiro, me ouviu ouvindo o LP. Meio sem jeito, minha mãe saiu do meu quarto, desconversou, mas não conseguiu evitar outra pergunta, essa vindo de mim, algumas horas mais tarde, quando estávamos a sós: “O que é um orgasmo?”, disparei à queima-roupa.
Desde então, os gemidos de Donna Summer ganharam na minha memória toda uma nostalgia poética. Graças a eles, recebi, talvez até precocemente, minhas primeiras noções de educação sexual. Sem pecado e sem juízo.