“O que você quer ser quando crescer?”. Quem nunca ouviu essa pergunta quando criança.
Tenho uma amiga que sonhava em ser chacrete, fascinada pela exuberância das dançarinas que acompanhavam o Velho Guerreiro em seu programa semanal, ao qual ela assistia, religiosamente, nas tardes de sábado, enquanto imitava, nos mínimos detalhes, as insinuantes coreografias de Rita Cadillac. Isso tudo na sala de sua casa.
Eu mesmo cheguei a pensar em ser ator. Apaixonado por cinema desde menino, fantasiava roteiros mirabolantes e me imaginava protagonizando longas-metragens. Lembro até hoje de dois filmes que vi nessa fase, entre os 10 e os 15 anos, que me marcaram demais: Idade da Inocência, de François Truffaut, e Um Pequeno Romance, de George Roy Hill.
Vivemos em um país onde a noção de sucesso está diretamente ligada ao mundo das aparências. Para muitos, senão a maioria, a educação não é um fim, mas um meio para obtenção de status, de bens materiais, de uma posição social de superioridade.
Ambos falam desse momento intenso entre a infância e a adolescência, em que nos percebemos em profunda transformação, a descobrir o amor, a sexualidade e as limitações da vida adulta. Minha vontade, quando os vi, era mergulhar na tela, e virar aqueles personagens, me tornar amigo deles. Assim, por algum tempo, sonhava em viver naquela dimensão ao mesmo tempo mágica e tão importante para meu aprendizado sobre a realidade. Virar astro de cinema, ironicamente, era a resposta mais rápida e ingênua para a tal pergunta a respeito de que profissão escolher no futuro.
Essas fantasias pueris de crianças me fazem pensar na perplexidade que senti, há poucas semanas, ao saber dos estudantes secundaristas gaúchos que se vestiram de garçons, frentistas, empregadas domésticas, garis e atendentes do McDonald’s, quando indagados sobre o que fariam se nada em suas vidas desse certo. A ideia era “vestir” essas profissões em uma atividade escolar para lá de mal pensada em qualquer aspecto.
Vivemos em um país onde a noção de sucesso está diretamente ligada ao mundo das aparências. Para muitos, senão a maioria, a educação não é um fim, mas um meio para obtenção de status, de bens materiais, de uma posição social de superioridade. Valores como satisfação pessoal e dignidade, embora não sejam completamente postos de lado, não são colocados no topo da lista de prioridades.
Ter sobrepõe-se o tempo todo a ser em um jogo performático no qual a imagem muitas vezes aniquila a essência. Importam mais o carro do ano, roupas de marca, fotos de viagem em redes sociais. Como se é percebido, enfim. No imaginário de jovens individualistas da classe média alta, embalado pela cartilha do consumismo e da descartabilidade, a pior das perspectivas é servir, e se tornar invisível por trás de um uniforme que lhes reduz a nada numa sociedade em que trabalhar cansa, e não vale quase nada.