A hospitalidade georgiana precisa ser estudada. Principalmente porque é difícil de avaliar. Encravada entre a Turquia, a Rússia, a Armênia e o Azerbaijão, o país resiste culturalmente graças a um senso forte de identidade nacional, o que compreende uma língua própria, um alfabeto próprio e uma variação própria do ortodoxismo. Mais importante do que isso para quem mora lá, talvez, seja mostrar que, apesar de serem um povo montanhês de clima quente, constantemente em animosidades com outros países e exportadores de mafiosos cruéis e ditadores sanguinários, são amigáveis e gentis com quem se interessa pelo país.
Sonhei em conhecer a Geórgia desde que li, há muitos anos atrás, Um Diário Russo, uma colaboração entre o fotógrafo de guerra Robert Capa e o prêmio Nobel de literatura John Steinbeck. Eles viajaram para a União Soviética em 1947, no início da Guerra Fria, para avaliar como viviam aqueles que viriam a ser os grandes antagonistas de seu próprio país. Minha vontade de conhecer a terra de Stalin não era despropositada: Steinbeck, que na época não era Nobel de nada e se considerava “pouco literário”, fez uma imensa propaganda a respeito da Geórgia a partir do que ouviu da boca dos russos: “Os georgianos eram mencionados como sendo super-homens, grandes bebedores, grandes dançarinos, grandes músicos, grandes trabalhadores e grandes amantes. E a região no Cáucaso e em volta do mar Negro era vista como uma espécie de paraíso na Terra”.
A criação de expectativas é largamente desencorajada pelo abismo que se abre entre o sonho e a realidade. Felizmente, não tive esse problema na Geórgia.
A criação de expectativas é largamente desencorajada pelo abismo que se abre entre o sonho e a realidade. Felizmente, não tive esse problema na Geórgia. Os vinhos, a culinária, as cantorias e as paisagens eram exatamente como eu sonhei. Mas havia sido advertido sobre a hospitalidade georgiana. “Eles são muito intrusivos, não deixe que eles cheguem muito perto de você, ou vão te prender na teia deles”, uma amiga russa me disse. E a verdade é que, se não há um plano traçado sobre o que ver e o que fazer na Geórgia, algum georgiano vai se ocupar disso por você, a ponto de te deixar com pouco poder de escolha. Esqueça pagar por táxis, escolher um restaurante ou achar do alto da sua curiosidade que algum lugar que eles não achem interessante mereça ser visitado. A cultura de outros povos pode ser permissiva com algumas coisas e restritiva com outras. É importante que um georgiano se sinta um bom anfitrião. O problema é que isso depende do tipo de visitante, daí ser tão difícil avaliar esse tipo de hospitalidade em termos gerais.
Fui muito bem tratado na Geórgia, de uma forma comovente, por uma família georgiana que me acolheu, me alimentou, me deu vinho, me divertiu e me levou para passear em diversos lugares. O que posso ter feito por eles em troca é muito pouco ou quase nada. Talvez possa contar a quem quiser ouvir sobre esse pequeno país e seu povo alegre e hospitaleiro, de uma hospitalidade meio atravessada, mas muito carinhosa. Posso também advertir que alguns ficaram incomodados. Eu não.