É um pouco triste quando nos mostramos muito entusiasmados em relação a alguém que parece não compartilhar do mesmo sentimento em relação a nós. Digo um pouco porque isso é muito comum e, particularmente, na vida adulta, nada que tange relações interpessoais é carregada de emoções muito fortes. Mas ainda assim é um pouco triste. A gente sente o maior carinho, o maior respeito, a maior admiração por aquela pessoa, pô, e em troca? Ah, uma parede gélida de indiferença ou, na melhor das hipóteses, uma cordialidade que não convence e, mais importante, não satisfaz.
Esse tipo de coisa acontece na infância também, mas em outras circunstâncias. Fazer um amigo quando se é criança é a coisa mais fácil do mundo. Basta que você seja criança e outra pessoa também seja criança, e que haja pouca diferença de idade para que as chances cresçam exponencialmente. A partir daí, qualquer proximidade geográfica e qualquer fator em comum – desde a idade até o sabor favorito de sorvete – é uma escalada vitoriosa rumo a laços vistos então como inquebrantáveis. A indiferença aqui ocorre por uma questão de crueldade juvenil, uma evolução da agressividade primitiva, uma versão passivo-agressiva de uma pedrada na cabeça de um neandertal, digamos. O que deixa tudo ainda mais triste em sua versão madura. Não é a crueldade ou a agressividade pura e simples que move essa não-correspondência de amizades, mas uma simples indiferença, uma falta de empatia incapacitante, que talvez pudesse ser mudada com um pouco de esforço mas ah, não deve valer a pena.
A amizade na vida adulta é naturalmente fria e cheia de desconfianças, e é frustrante constatar isso todas as vezes em que o entusiasmo desafia a lógica.
A amizade na vida adulta é naturalmente fria e cheia de desconfianças, e é frustrante constatar isso todas as vezes em que o entusiasmo desafia a lógica. Com algumas pessoas, tentei me mostrar solícito e amigo algumas vezes antes de desistir por completo, não sem aquela nuvem escura por cima da cabeça que lembra sempre que fui eu que pedi por isso. No livro A Marca Humana, de Philip Roth, o narrador Nathan Zuckerman lamenta ter perdido a amizade do protagonista do livro, o professor Coleman Silk, e pondera que, nesses casos, a tendência natural é achar que a culpa é sempre nossa. E de fato é assim. Devemos ser muito chatos e desinteressantes e sem-graça e velhos e a única razão pela qual alguém se aproximaria da gente seria por puro interesse, por isso é melhor não dar confiança pra ninguém… epa.
As artes são repletas de histórias de amores não correspondidos, mas há pouquíssimos casos de amizades desencontradas. Talvez sejamos mais estoicos em relação a um laço fraternal não-consumado, talvez negligenciemos a dor de tal sentimento pela pluralidade de conexões dessa categoria possíveis de serem criadas ao longo da vida. Mas dói. Até que não dói mais e vira um ressentimento que some em meio ao turbilhão da vida que precisamos tocar enquanto convivemos com isso.