1 – Fui para São Paulo por um fim de semana para promover debates literários na primeira edição do Emil – Encontro Mundial da Invenção Literária. O evento é titânico: 120 autores espalhados em 36 pontos da cidade. Pontos bem distribuídos, por sinal. O último evento é tão longe do centro da cidade que acontece em uma Livrarias Curitiba.
2 – Até setembro deste ano, quando fui ver um show de uma banda que eu gosto muito, tinha uma relação completamente diferente com São Paulo. Era sinônimo de trabalho e coisas chatas. Vim aqui para fazer uma prova para a Folha de S. Paulo, cobrir uma matéria de edital cultural pela Gazeta do Povo e acompanhar meu pai numa cirurgia muito complicada. Nada disso fez a imagem da cidade melhorar aos meus olhos.
3 – Como não dirijo e acho extremamente complicado andar de ônibus em um trânsito caótico como esse, acabo andando muito de metrô, que tem ar condicionado e é bem eficiente em termos de tempo de deslocamento. A consequência disso é que acabo conhecendo São Paulo apenas por baixo da terra, e o meu senso de direção continua pautado por linhas artificialmente retas com pontos que em nada dizem ao que acontece acima do solo.
4 – Me hospedei em um albergue típico para mochileiros, com paredes pichadas com mensagens irritantemente felizes, cores fluorescentes nas portas e uma craca de sujeira em todo recôndito do imóvel. O recepcionista da noite é um menino magro, alto, gay, de bigode, cabeludo, com triângulos tatuados no corpo e que faz teatro e lê romances de temática LGBT. Tenho a mais absoluta certeza de que ele vai morrer negando ser o clichê que é.
5 – Não há glamour como o glamour paulista. Restaurantes chiquérrimos e shopping centers massascrantes de tão fora da realidade compõem o cenário das áreas nobres da cidade. De outro lado, algumas ruas são sujas e apinhadas de pessoas dormindo embaixo das marquises. Não há muitas coisas para o meu padrão de vida, de modo que me senti hostilizado nos dois extremos.
6 – Tenho uma leve impressão de que, em termos de dominação imperialista — para usar aqui um jargão vermelho — há tantos Starbucks quanto McDonald’s espalhados pela cidade. Curioso como uma rede de café oriunda de um país que notoriamente não sabe beber café se instala em um dos mais grandiosos países produtores de café e ganha dinheiro à beça vendendo café. Devem ser os copos, que são legais, grandes e tem uma tampinha marota que permite beber café por um buraquinho minúsculo.
Cruzei a Ipiranga com a São João e absolutamente nada aconteceu no meu coração. Talvez, apenas, uma sensação de que essa cidade é a maior fábrica de fazer maluco que eu já presenciei.
7 – São Paulo deve ser o último viveiro de uma raça ameaçada de extinção: o taxista honesto. Em nenhum momento tentaram me enganar nos trajetos, o que é algo assustador para quem vem do Rio de Janeiro. Felizmente, todos continuam reacinhas de marca maior, e basta avistar uma ciclovia e reclamar da falta de espaço para os carros que a caixa de Pandora se abre. E se mencionar o Uber então…
8 – A programação cultural da cidade é monstruosa. Tudo está acontecendo em todos os lugares para divertir as 16 milhões de almas que habitam essa loucura. Peguei um engarrafamento no Morumbi porque tinha, no mesmo dia, treino da Fórmula 1 e show do Pearl Jam, o que parece algo insólito para um habitante de Curitiba que já se sentiu meio perdido com o show da Pitty acontecendo ao mesmo tempo que o vestibular da UFPR.
9 – Cruzei a Ipiranga com a São João e absolutamente nada aconteceu no meu coração. Talvez, apenas, uma sensação de que essa cidade é a maior fábrica de fazer maluco que eu já presenciei.