Conto dos mais parodiados e reinterpretados da história, A Pata do Macaco, do britânico W. W. Jacobs (ah, os escritores que abreviam tudo menos o sobrenome, que poder enorme acreditam ter), é uma mistura de Fausto impessoal com Alladin macabro em que a contrapartida para o contrato é inerente ao bem desejado. Na história, uma família acha uma pata de macaco que concede três desejos a quem a possuir, com desfechos desastrosos para cada pedido. Por exemplo, a mãe da família pede uma quantia em dinheiro para quitar a dívida da casa e descobre no mesmo dia que seu filho foi morto em um acidente de trabalho. A firma então lhe proporciona um cheque no exato valor que desejou à pata de macaco.
Eu, de minha parte, sempre quis ter uma biblioteca particular cheia de livros legais para ler. Comecei a pegar gosto pela leitura aos 16 anos com Charles Bukowski e lia qualquer coisa que parasse na minha mão, achando tudo incrível. Com os anos, fui formando meus gostos pessoais, desprezando alguns tipos de livros e louvando outros, e comecei a escrever em um blog sobre as minhas leituras recentes. A coisa deu certo e, alguns anos depois, migrei o suporte para o YouTube, quando soube que a comunicação por lá acontecia numa velocidade absurdamente maior. Em alguma medida é possível afirmar que a coisa deu certo, já que me permitiu conhecer partes do país que não conhecia graças a esse veículo, falar com escritores interessantes e receber muitos livros de presente de leitores, além dos habituais de divulgação das editoras.
A pata de macaco que me trouxe essa biblioteca incrível me deu também a sabedoria necessária para perceber que a vida é curta e que não é possível viver apenas para ler livros quando há um redemoinho de experiências me esperando lá fora.
Consequência disso é que agora eu estou soterrado por livros maravilhosos esperando para serem lidos, e não consigo ter tempo de ler todos eles na velocidade em que eu quero. As obrigações acumulam, algumas leituras obrigatórias passam na frente, e o desejo específico por um ou outro acaba sobejado pela ansiedade de vencer a pilha sisífica de não lidos. A pata de macaco que me trouxe essa biblioteca incrível me deu também a sabedoria necessária para perceber que a vida é curta e que não é possível viver apenas para ler livros quando há um redemoinho de experiências me esperando lá fora. Ainda assim, não me sinto triste por saber que talvez nunca vença a pilha enorme de não lidos, quando a cada mês chegam mais tijolos para compô-la. Aceito de bom grado a danação da pata de macaco como aceito a vida: sem pressa.