John Fante foi responsável por salvar Charles Bukowski da descrença literatura. No prefácio da nova edição de Pergunte ao Pó (José Olympio, 208 páginas), o Velho Safado conta a experiência de encontrar o livro em uma biblioteca pública e, pela primeira vez, se identificar com um personagem – no caso, Arturo Bandini. Clássico roman à clef, a obra causou estardalhaço quando chegou às livrarias em 1939, misturando ficção a incidentes autobiográfico.
Bandini é um norte-americano de origem italiana, que podia muito bem ser um Corleone, que precisa encontrar uma maneira de sobreviver à Grande Depressão. De hotel em hotel, ele vive de pequenos golpes enquanto tenta emplacar suas histórias em revistas de prestígio. Sua relação conturbada com Camilla Lopez se transforma em uma rat race, uma espécie de estatização da femme fatale, mas que ao invés de ser forte e sedutora, é uma criatura amedrontada e frágil. Fante faz de seu personagem uma catarse de si próprio, algo muito semelhante ao que Bukowski faria com Henry Chinaski ou João Antônio com seus “merdunchos”. Se Dickens escrevesse sobre Oliver Twist em seus 20 ou 30 anos, ele bem poderia ser Bandini.
Fante não foi o primeiro a falar da pobreza ou a vida nos subúrbios, mas seu retrato é in loco, oferecendo ao leitor uma experiência às raias do real. O sentimento de culpa, tipicamente católico, sua própria identidade – uma batalha entre os costumes europeus e norte-americanos – e uma vida familiar e estável criam uma rede que faz de Arturo um personagem fascinante.
Bandini e Camilla representam os desejos de não fracassar, as lutas diárias para manter-se íntegro e vivo – vivo, acima de tudo.
Não existe esperança em Pergunte ao Pó. Todos estão cheios de um grande vazio, uma erosão que consome cada um e os deixam estáticos. São homens e mulheres paralisados por um país em agonia. Todos têm pés de barro, cada vez mais afundados em uma sociedade formada por um grande lamaçal. Bandini e Camilla representam os desejos de não fracassar, as lutas diárias para manter-se íntegro e vivo – vivo, acima de tudo.
Tradução
A primeira edição brasileira, publicada em 1984 pela Brasiliense, foi traduzida pelo poeta Paulo Leminski e é considerada uma das obras-primas tradutórias. À época, Leminski comentou que seus trabalhos como trabalhos como tradutor são fruto de um desejo egocêntrico.
A versão atual, de Roberto Muggiati, não deixa desejar: resgata o desabafo original de Fante e coloca o leitor – e suas certezas – em xeque. Por curiosidade, Muggiati também é curitibano e faz parte da Academia Paranaense de Letras. Sob sua batuta estão nomes como Jack Koureac, Charles Mingus e James McBride.
PERGUNTE AO PÓ | John Fante
Editora: José Olympio;
Tradução: Roberto Muggiati;
Tamanho: 208 págs.;
Lançamento: Maio, 2003.