Em Primeira Página – Conflito na Baiana, o jornalista JM Costa conta a história de Clara Gabo, uma repórter em início de carreira que trabalha no Diário Carioca e que certo dia recebe a ligação de uma criança de 9 anos, narrando um crime extremamente violento que estava acontecendo naquele exato momento em uma favela do Rio de Janeiro. A partir daí, a repórter vai atrás da garota (ou apenas da história da garota?) e o livro entra num ritmo alucinante que só encontrará respiro no seu ponto final.
Essa é a estreia de JM Costa na ficção e a habilidade com as palavras não chega a ser uma surpresa, já que lidar com elas foi o seu ofício ao longo de 25 anos em que trabalhou nas redações de grande jornais. Toda essa experiência se faz presente em momentos importantes do livro, quando nos defrontamos com detalhes muito precisos da rotina da repórter que precisa lidar com os problemas da violência da cidade, mas também com as questões burocráticas e de compadrio dentro do jornal.
Os protagonistas da literatura policial costumam ser sujeitos que trabalham como detetives, mas os repórteres já andaram fazendo investigações em outras obras, como no caso de Mikael Blomkvist, da trilogia Millenium. O interessante do viés jornalístico é o ponto de vista de fora dos comandos, o que eventualmente pode representar uma visão mais crítica ou distanciada dos procedimentos usuais.
Clara Garbo não é uma personagem muito complexa, pelo menos aqui nessa sua primeira aventura o que temos é uma jovem deslumbrada com a profissão, sem muito tempo para a família e imbuída de uma coragem que beira a irresponsabilidade. O lado bom disso é que o autor evita repetir o estilo de outros protagonistas famosos por suas bebedeiras e por suas almas atormentadas.
O interessante do viés jornalístico é o ponto de vista de fora dos comandos, o que eventualmente pode representar uma visão mais crítica ou distanciada dos procedimentos usuais.
O ponto fraco do livro está na falta de sutileza do JM em desenvolver a paixão da protagonista pela profissão, já que essa informação é repetida inúmeras vezes. O texto simples e repetitivo funciona na redação jornalística, mas na literatura eles podem ser um grande problema, uma vez que empobrecem demais a história. Ao ser tão ostensivo e óbvio na forma com que retrata a importância que dá ao jornalismo, o autor acaba fazendo com que a gente se desconecte da história para ler discursos que lembram muito a autoajuda ou a publicidade.
Essas informações já estavam bastante evidentes a partir das atitudes da personagem, então transformar isso em “reflexões” explícitas e ingênuas acaba sendo bem redundante, além de subestimar a capacidade de compressão do leitor. Creio que essa seja uma falha de romancista iniciante e que pode muito bem ir sendo podada com o passar do tempo, conforme o texto vá sendo melhor trabalhado.
Felizmente, nem só de propaganda em prol do jornalismo vive Primeira Página, já que excetuando estes momentos, o livro é muito eficiente ao construir uma tensão crescente, que te faz ficar grudado nas páginas (eu li tudo de uma vez, pois simplesmente não consegui parar de ler). O ponto mais alto está nesse ritmo acelerado da narrativa, uma vez que JM Costa vai manejando muito bem os desdobramentos do enredo, que conta com algumas reviravoltas interessantes e trechos bem cinematográficos.
O livro se mostra atual tanto por mostrar este lado caótico do Rio de Janeiro que vemos todos os dias nos jornais, como também por borrar um pouco as linhas que dividem o certo e o errado nos conflitos entre traficantes e policiais, bem como na cobertura jornalística disso tudo, o que torna a história não tão simples quanto pode parecer num primeiro momento.
De modo geral, Primeira Página é um livro que apresenta falhas evidentes, mas que não chegam a comprometer o todo, pois a diversão proporcionada acaba sendo o ponto mais relevante. Que venham as próximas reportagens de Clara Gabo.
PRIMEIRA PÁGINA | JM Costa
Publicação independente;
Quanto: R$ 35,00;
Lançamento: Junho, 2017.