O Instagram pode fazer a poesia ser legal novamente? Esse é o questionamento que guia o documentário #poetry, produzido pela youtuber Ariel Bissett e lançado na última quarta-feira (3). Nele, Bissett busca entender como os novos poetas estão usando o Instagram para compartilhar sua poesia com os leitores, por que há um movimento contra os criadores online, como a plataforma permitiu que as mulheres prosperassem em um novo ambiente e por que milhões de pessoas estão seguindo poetas na internet.
O pontapé inicial para se assimilar o movimento da poesia digital é entender a maneira como esse novo tipo de distribuição é drasticamente oposta à distribuição do conteúdo em livros. No caso do Instagram, a coleção de poesias é oferecida ao público a “conta gotas”, sendo lida aos pouquinhos e não de uma só vez, como acontece nos impressos.
A dimensão do impacto que a poesia digital causou no universo editorial pôde ser sentida até mesmo em uma das maiores editoras britânicas, a Faber & Faber, fundada em 1929 e conhecida principalmente por ter publicado vários livros de poesia. A Faber & Faber lançou em abril deste ano o Faber Poetry Podcast, um podcast quinzenal produzido e apresentado pelos poetas Rachael Allen e Jack Underwood, que se propõe a dar voz a novos artistas do gênero e discutir a poesia contemporânea.
Mas afinal, isso ajuda ou não a indústria editorial? Ajuda no sentido em que populariza o gênero literário, mas atrapalha pois muda o consumo de plataforma. Além disso, quando os novos autores optam por publicar livros físicos de suas coleções, o fazem de maneira alternativa e independente, desafiando a indústria estabelecida.
Nesse sentido, é interessante observar como o autor deixou de ser apenas quem escreve, para se tornar também um pouco designer, a fim de montar um feed com personalidade e criar uma marca sobre si mesmo. No artigo “Why the world’s most talked-about new art dealer is Instagram”, escrito por Olivia Fleming para a revista Vogue, a jornalista explicita como os artistas vêm assumindo diversos papéis. “…artistas usam o Instagram como sua própria galeria de arte, onde são ambos, vendedores e curadores enquanto seus fãs viram críticos e colecionadores…”, afirmou.
Leitores x Algoritmos
Um estudo realizado pela Royal Society for Public Health e pelo Young Health Movement constatou que o Instagram e o Snapchat são as plataformas mais destrutivas em termos de impacto na saúde e bem-estar de jovens entre 14 a 25 anos, causando problemas como ansiedade, depressão e perda de autoidentidade.
A preocupação apontada pelos críticos é de que, na verdade, os autores que publicam seus conteúdos online estão escrevendo para satisfazer algoritmos e não leitores, perdendo dessa maneira a essência de seu trabalho.
Ao postarem sua arte no Instagram, os artistas buscam por uma espécie de validação do público, que, quando obtida, libera no corpo doses de dopamina, o hormônio da felicidade e bem-estar. O que nos leva a algumas questões: essa busca por validação pode afetar a criatividade? Os insta-poetas estão produzindo conteúdos rasos e rápidos apenas para obterem curtidas e elogios?
Outro questionamento que surge quando abordamos o assunto é a maneira como os escritores estão se tornando reféns do misterioso algoritmo do Instagram, responsável por definir quais postagens irão, ou não, aparecer no feed de cada usuário. A preocupação apontada pelos críticos é de que, na verdade, os autores que publicam seus conteúdos online estão escrevendo para satisfazer algoritmos e não leitores, perdendo dessa maneira a essência de seu trabalho.
Democratização da literatura
Por muito tempo, a poesia demandou um certo nível de cultura para entendê-la, mas agora, com a chegada do Instagram, está sendo democratizada. Autoras como Rupi Kaur, Hollie McNish e Charly Cox estão produzindo um tipo de poesia não-literária, direcionada a um público para qual não era escrita no passado: pessoas de cor, mulheres e jovens.
Em entrevista para o documentário #poetry, a poeta e instagrammer Hollie McNish defende que os criadores de sua geração não são melhores nem piores que os das gerações passadas, e chega a sugerir que, se Shakespeare ou Bukowski estivessem vivos, postariam seus sonetos e poesias online, e compartilhariam acontecimentos de seu dia a dia nas redes sociais.
Por fim, não há como dizer se a poesia no Instagram está trilhando um caminho ideal ou não, no entanto, não restam dúvidas, ela com certeza está marcando a história da literatura e revolucionando a maneira como jovens se relacionam com a arte.