Morreu, aos 36 anos, Elis Regina. O Brasil está parado, em uma catarse coletiva. Uma multidão de fãs se aglomera por toda a extensão da Avenida Brigadeiro Luís Antônio, na altura do número 1401.
O Teatro Bandeirantes tem seu maior público num dos dias mais tristes da música popular brasileira. Elis deu entrada no pronto-socorro do Hospital das Clínicas às 11h45, já sem vida, em contraposição ao cortejo que a acompanhou até o Cemitério do Morumbi.
Brigadeiro Luís Antônio, viaduto Pedroso, 23 de maio, Rubem Berta, avenida dos Bandeirantes, Luís Carlos Berrine, ponte do Morumbi, avenida Morumbi, Professor Carlos Gama. A chegada na Deputado Laércio Corte.
Quis o destino que a última apresentação da Pimentinha percorresse a cidade que “é o túmulo do samba”, como, reza a lenda, afirmou Vincius de Moraes.
Adoniran Barbosa, responsável por “desmentir” o Poetinha, sentou no Bar da Dona Carmela, no Bexiga, em 1978, durante especial da TV Band, e cantou e foi encantado por Elis Regina. “Não é porque o samba é meu, mas você canta como eu quero”, afirmou o compositor paulistano. “Você leva a sério as coisas, não fica fazendo gracinha”. Naquele dia, entre copos de cerveja, Adoniran não titubeou. “Você é nota 11,5”. E era.
Morte de Elis Regina completa 40 anos
Poucas artistas conseguiram se reinventar tanto na carreira, ou mesmo trafegar por diferentes gêneros e ser tão ímpar em cima de um palco como ela.
Foi há 40 anos, mas poderia ter sido hoje. E isso só porque a cantora segue sendo uma das maiores da história deste país torto chamado Brasil. Uma comoção tomou conta do país no dia 19 de janeiro de 1982.
Quando a notícia de sua morte se espalhou, lembremos ser uma época sem internet e redes sociais, as imediações do Instituto Médico Legal (IML) paulistano ficaram abarrotadas de amigos, parentes, artistas e fãs. Dezenas de pessoas saíram de seus lares e foram tentar obter mais notícias na porta do IML, entre elas Tônica Carrero, os músicos de sua banda (Janjão e Natan, respectivamente baterista e guitarrista), Clara Nunes, Eduardo Suplicy, o compositor Eduardo Gudin.
Elis era plural, progressista, sensível à realidade do país. Amou como ninguém o mundo e a vida. Uma mulher direta, sem rodeios. Sempre gostou de falar. Por isso, o silêncio ensurdecedor causado pela ausência de sua voz ecoa até os dias atuais.
Cantora tem sido descoberta internacionalmente quatro décadas depois
O Brasil não superou Elis, e certamente não superará. Poucas artistas conseguiram se reinventar tanto na carreira, ou mesmo trafegar por diferentes gêneros e ser tão ímpar em cima de um palco como ela. E tudo isso em pouquíssimo tempo, tão pouco que a música popular brasileira já viveu mais sem a artista do que ela neste mundo.
Elis Regina tinha 36 anos quando partiu. Como legado, três filhos, todos de alguma forma envolvidos com a música, e 30 discos. Elis não teve para si a internet, a mesma que ainda consume seus vídeos. Mais recentemente, tornou-se alvo dos youtubers estrangeiros que compartilham suas reações a vídeos e têm descoberto a música feita no Brasil. A constatação é uma só: ela segue sendo genial, 40 anos depois.
Morte precoce interrompeu uma carreira sem precedentes
No auge de seu sucesso, Elis Regina havia assinado um contrato com a Som Livre três meses antes. A cantora e as canções que interpretava se tornaram uma coisa só.
Pensar na música nacional é vislumbrar a potência e recursos técnicos de sua voz, tão marcantes a ponto de serem uma espécie de estilo, por vezes mimetizado na MPB. Sua cinebiografia é, talvez, o desvio na curva, tamanha pequenez e conservadorismo do roteiro.
Para 2022, parte de seus discos serão remasterizados – processo que digitaliza as canções, fazendo uma limpa no material de origem e corrigindo imperfeições de modo a garantir ganhos finais em qualidade. Uma das novidades já foi lançada.
O álbum com faixas raras Essa Saudade chegou aos serviços de streaming, contendo canções como “Bolero de Satã”, em dueto antológico com Cauby Peixoto; “Pequeno Exilado”, fora de catálogo desde 1980; e uma versão alternativa de “Alô, Alô Marciano”.
Também estão na pauta alguns documentários, a serem lançados ao longo do ano, além de um musical e uma história em quadrinhos. Ainda bem que o Brasil ainda não superou Elis.
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