Trent Reznor já acabou com o Nine Inch Nails diversas vezes, já disse que não ia mais gravar músicas inéditas, disse que não iria mais fazer shows. Como alma inquieta que transparece ser, o músico não hesita em falar publicamente sobre seus planos, suas expectativas e maneira como enxerga o cenário e a conjuntura política atual.
Em entrevista ao The Guardian, Reznor afirmou que não acredita que somos os seres iluminados que acreditamos ser, que somos apenas fruto de mutação e acidente e, de alguma maneira, essa frase é uma via de acesso ao que se encontra no cerne de Bad Witch.
Enquanto os Estados Unidos experimentam um mergulho profundo no que o capitalismo parece ter produzido de pior, Reznor usa a música como meio de refletir sobre os últimos acontecimentos. Como a maioria da classe artística, o músico se revelou particularmente incomodado com o presidente e como a situação do país e, é possível afirmar que, desde que “God Break Down the Door” apareceu mês passado, uma música do Nine Inch Nails não refletia tanto desconforto e dissonância há muito tempo.
Enquanto os Estados Unidos experimentam um mergulho profundo no que o capitalismo parece ter produzido de pior, Reznor usa a música como meio de refletir sobre os últimos acontecimentos.
Com o lançamento do EP, fica claro que a sintonia de Reznor com o momento atual é inegável, como podemos constatar já com o título das músicas, como “Shit Mirror”, “Ahead of Ourselves” e “I’m Not From This World”. Mais uma vez insistindo no som que fez sua fama, Trent Reznor apresenta um álbum pesado, eletrônico e ligeiramente melancólico, como se de fato o presente tivesse se infiltrado pelas frestas da composição e refletido no resultado final.
Cheio de ruídos e preenchido à totalidade pelas batidas industriais que são a marca registrada da banda, Bad Witch soa como a trilha sonora do fim do mundo. Enquanto assistimos bestializados ao desenrolar dos últimos acontecimentos, a violência e a melancolia sonora que explodem ao longo dos 30 minutos de experiência auditiva fazem com que pensar sobre o fim seja quase que obrigatório.
Por mais que a trilogia como um todo não esteja à altura de grandes momentos da banda, como Downward Spiral ou The Fragile, a busca de Reznor por uma linguagem e uma expressão que coubesse numa nova duração é interessante e vai na contramão do que vem sendo feito hoje em dia. Um dos pontos altos do EP é, sem dúvida, a última faixa, “ Over and Out”, em que há um claro flerte com o synthpop e toques levemente soturnos que ecoam Joy Division.
Em meio ao clima de Copa do Mundo e à felicidade generalizada espalhada pela vitória da seleção brasileira, esse lançamento serve para nos lembrar que o mundo ainda é um lugar problemático, fraturado, cheio de dor e desigualdades para as quais não temos solução em vista. Às vezes, é bom vislumbramos o precipício, mesmo que seja apenas para decidir não pular e pensar em uma outra saída.