Desespero: 1. Ação ou efeito de desesperar; desesperar-se; desesperação. 2. Condição excessiva de desânimo em que uma pessoa se sente sem capacidade para realizar alguma coisa; desalento. 3. Estado de espírito (sensação ruim) que faz com que alguém acredite estar num momento sem saída; desesperança: por desespero acabou se entregando aos vícios. 4. Sentimento de angústia ligado, geralmente, ao descontrole, à aflição, à sensação de perda etc. 5. Excesso de irritação; raiva ou cólera.
Paciência: 1. Virtude que faz suportar com resignação a maldade, as injúrias, as importunações etc. 2. Perseverança, constância.
O que é o desespero? É importante que o leitor tenha uma resposta pessoal, desconectada do significado semântico do termo. Você é paciente? Como você se tornou paciente? Em tempos tão urgentes, onde a tônica é a velocidade, a rapidez, relações acabam pautadas pela sensação de um vazio crônico. É difícil crer que estamos sendo úteis, ou fazendo algo útil. A rotina exige padrões comportamentais que nem sempre vão ao encontro de nossos anseios, e nesses momentos nos sentimos perdidos, angustiados, massacrados pelas batidas dos cartões, pelas canções que não gravamos, pelos livros que não lemos.
A música, seus conjuntos de acordes emitidos por instrumentos empunhados por pessoas que, assim como eu e você, estão à mercê das intempéries da vida, por vezes sofre com esta urgência cotidiana. Ouvimos música enquanto escrevemos, trabalhamos, andamos, corremos, viajamos, comemos, trepamos… Há pouco tempo para se contemplar as narrativas impressas na música, a poesia expressa nas letras. Afinal, por que Bob Dylan foi digno de um Nobel de Literatura? Apenas política?
No álbum, uma sucessão de notas são dispostas de maneira que exige de seu ouvinte a paciência. Você precisa de tempo, para a música e para Do Desespero Eu Fiz a Paciência.
A música é capaz de causar transformações em nossa menor e mais essencial partícula. Não se trata apenas de evocar o amor, a alegria, ou mesmo a melancolia, um instante lúgubre. Não há uma única resposta sentimental à música, assim como ela não parte de uma mesma origem. A música é um instrumento comunicacional, e age em cada pessoa de forma distinta. Justamente por isso, é comum que se diga que não há como expressar as sensações causadas por uma música, um disco, um show.
Toda esta constatação surge da audição de Do Desespero Eu Fiz a Paciência, novo disco da Farol Cego. O álbum é a expressão destas atribulações mundanas e corriqueiras, da pressão sofrida no cotidiano de uma grande cidade, das relações humanas estabelecidas por seus quatro integrantes. Do que ouvem, comem, sentem, exalam ou absorvem.
No álbum, uma sucessão de notas são dispostas de maneira que exige de seu ouvinte a paciência. Você precisa de tempo, para a música e para Do Desespero Eu Fiz a Paciência. Ainda que apenas com cinco faixas, o álbum passeia por uma essência muito mais alternativa e experimental que Zênite (leia crítica aqui) e os singles disponibilizados nos últimos dois anos. Ainda que haja uma predominância de faixas letradas (“Coda”, “Pâro” e “Alpinista”), a Farol Cego aposta em paisagens sonoras e composições que extrapolam o habitual, ultrapassando a marca de sete minutos em duas canções, soando muito próximo do post rock.
Esse contraponto entre as narrativas liricamente expressas e as sonoramente expressas não tornam Do Desespero Eu Fiz a Paciência dois registros em um. Na realidade, são complementos. Elas existem apenas dentro desta possibilidade, na qual o grupo traz o ouvinte para dentro deste trajeto entre o desespero de ontem e a paciência de hoje. E que passeio.