Em setembro de 2015, quando a NASA confirmou a existência de fluxos de água líquida sazonais no Planeta Vermelho, descoberta que aumentava as chances de haver vida em Marte, o debate acerca da presença de vida ou não por lá tomou conta, inclusive, de mesas de bar. Toda essa discussão não surgiu hoje. Desde que a nave Mariner 9, a primeira a orbitar Marte, no começo dos anos 1970, encontrou cânions, bacias e outros indicadores geológicos de que a água líquida esteve presente lá, surgiu um movimento em determinar se a vida é viável ou não no Planeta Vermelho.
Na contramão das dúvidas, Marcelo Maus, Roger Larsen e Rômulo Genaro deixam claro que, mais do que vida, há peso em Marte. O trocadilho infame surge por conta da banda do trio, a banda de metal progressivo Marte, que nas palavras do grupo faz “roque marciano”.
Em um ambiente bem íntimo de melodias mais densas, uma visão desconstruída de mundo é exposta nas seis faixas que compõe o EP homônimo, Marte. Uma série de tormentos e versos amargos sobre desejos, medos, presente-passado-futuro e, até, sobre a condição humana no universo, tudo isso com pitadas de mitologia e psicodelia estão presentes no disco. Mas fique tranquilo, todo esse viés meio soturno, esse terror à espreita, são elementos que adicionam peso de forma consistente, madura, fugindo de qualquer possibilidade de abordagens mais infantilizadas ou folclóricas sobre o que os músicos se propõem a falar.

Essa naturalidade da Marte marca o ouvinte, principalmente pela demonstração de criatividade na formação de riffs em estruturas naturais, colocando distorções e afinação em sintonia, sem escorregar em uma sujeira inaudível e incompreensível. Uma audição mais profunda do EP deixa clara a pluralidade de referências musicais que alimentam o som do grupo, um verdadeiro mosaico em tons de preto, resgatando algumas tendências instrumentais do Doom Metal inglês dos anos 70, ou mesmo do que viria a se espalhar como Sludge Metal nos anos 80 – como o Eyehategod – e Gothic nos anos 90 – como o Type O Negative.
Essa naturalidade da Marte marca o ouvinte, principalmente pela demonstração de criatividade na formação de riffs em estruturas naturais.
Todo trabalhado na ambientação de um universo próprio – que pode ser no próprio Planeta Vermelho -, a Marte converge para um novo cenário da música feita para headbangers. Nele, é possível manter um diálogo entre artista, público e cena musical, apresentando a própria vertente do metal a uma nova geração e resgatando a alegria de encarar um gênero que exorciza todos teus demônios.
Poucos artistas atualmente parecem compreender bem o espírito do rock, em que o produto final depende (muito!) da possibilidade de incorporar elementos e dialogar com seu público, quase num processo gradual de ensinamento em que você transporta (e apresenta) o ouvinte para um universo novo, em que esse labirinto de ruídos, riffs, distorções e batidas passará a fazer sentido e ser apreciado. E, para isso, talvez você tenha que ser o precursor, o que nem todos estão dispostos a fazer.