Encontros podem ser motivados por situações que extrapolam nossa compreensão. Ainda que os encontros fortuitos sejam marca constante na nossa vida – ou que assim os vejamos –, a verdade, para algumas pessoas, é que eles sempre estiveram à espreita, pois estavam predestinados a acontecer. Neste sentido, as razões pouco importam. Aceitamos os encontros como quem aceita “bom dia”. É natural.
Obviamente que nem todos os encontros dão frutos, mas ocasionalmente saímos destes encontros transformados, renascidos. Isto ocorre de forma maior quando os encontros são motivados pela alma, uma experiência metafísica acima de tudo. A chave destes experimentos é que eles fogem a explicações mil, por efeito de seu caráter íntimo e singular. Cada um de nós viverá esse momento à sua maneira. À vista disso, protagonizamos achamentos a cada dobrar de esquina.
Uma História Úmida, projeto que reúne o músico Luciano Faccini (e/ou) e a música Melina Mulazani, trata justamente desta confluência, a partir da proximidade de sons, sentidos, sentimentos, prazeres e química. Lançado no último dia 7 de outubro, o álbum registra em suas 10 faixas um pouco de tudo do que são feitos.
Faccini e Mulazani traduzem de forma minuciosa a braveza da poesia, a singeleza da música e a eternidade do encontro.
Em “Samba da Bênção”, de Vinicius de Moraes e Baden Powell, o poetinha tenha talvez eternizado a melhor definição sobre a vida. “A vida não é brincadeira, amigo / A vida é a arte do encontro / Embora haja tanto desencontro pela vida”. E a dupla não foge dos desencontros, assim como não foge das tristezas e dos tropeços da vida, mas faz da música o seu refúgio e das canções de ambos e dos que participam da empreitada (a saber: Luiz Felipe Leprevost, Miro Spinelli, Ary Giordani, Luis Otávio Almeida, Janaína Matter, Raul Cruz, Carlos Careqa e Ivan Graciano) um oásis de esperança.
Uma História Úmida é das obras que dizem o indizível quando se esforçam em externar a alma. É assim que o disco torna-se ponto de encontro das almas atormentadas pelos tempos obscuros, que todo tipo de golpe insiste em trazer. Mas há força, porque não há medo de enfrentar a tormenta e tampouco desejo de fugir à ressaca. Nisto a arte é forte. Ela não se acovarda. Tem a força de mil leões que, sem a possibilidade de serem domados, rugem em nosso peito.
Faccini e Mulazani traduzem de forma minuciosa a braveza da poesia, a singeleza da música e a eternidade do encontro. Porque nisto há de crermos. Ainda que nos tirem a dança, o couro e estraçalhem o coração, a alma há sempre de vagar à procura do próximo encontro. E ele será único, completo, arrebatador, desconcertante. Não há viv’alma capaz de sair o mesmo deste choque poético, tudo porque, como disse Vinicius, “a vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida”. Saravá, Luciano. Evoé, Melina.