Se o rock tem uma grande virtude, é sua capacidade de cruzar diferentes vertentes sem perder a essência de seu DNA. Aliás, é algo muito mais recente essa necessidade de subdividir o gênero – o que alguns chamam de rotular. A manauara Anônimos Alhures, grupo que apesar de uns bons anos de estrada, recém lançou seu disco de estreia, o forte A Maquinaria Começou a Rodar, é um fantástico exemplo de como caminhar pelo universo rock-and-roll sem soar caricato. Das inúmeras coisas que chamam a atenção no trabalho da banda de Manaus, algumas precisam ser destacadas.
Olívia de Moraes, guitarrista, vocalista e tecladista do grupo é uma excelente demonstração da força do rock com alma feminina. Para além do dream pop ou da MPB neoindie, caminhos mais comuns trilhados por grupos com vocais liderados por mulheres, a Anônimo Alhures vai buscar influências em vertentes do rock dos anos 1970 e 1980, criando um álbum extremamente coeso, mantendo equilíbrio do início ao fim, algo importantíssimo em se tratando de um primeiro lançamento.
Entre o acid rock do The Jimi Hendrix Experience e do Cream, e o peso do stoner rock, marcado pelos californianos do Kyuss, Olívia e companhia ainda caminham pelo indie rock do início dos anos 2000. As transições são tão suaves, que fica nítido o esforço em entregar ao público uma obra que deixa clara as influências do grupo, mas também demonstra uma identidade própria pautada pelos riffs pesados e as linhas melódicas precisamente encaixadas da cantora.
Entre o acid rock do The Jimi Hendrix Experience e do Cream, e o peso do stoner rock, marcado pelos californianos do Kyuss, Olívia e companhia ainda caminham pelo indie rock do início dos anos 2000.
A Maquinaria Começou a Rodar abre com uma faixa instrumental, “E Antes de Embrenhar-se de vez no Inferno Verde, Quente e Inóspito, Orellana disse”. Curiosamente quebrada pela seguinte, a balada “Paranoia”, provavelmente a melhor das oito que compõe o disco, essa dupla escancara a nossa limitada compreensão e conhecimento da cena do norte do país.
“Não diga que não sou capaz, você não me conhece”, canta Olívia, acompanhada de um instrumental que demonstra o bom trabalho na cozinha. Aliás, as linhas de baixo do disco estão em perfeita harmonia com a bateria, conferindo o peso necessário ao “bate-estaca” do grupo. E isso fica mais claro ainda na faixa “Distúrbio Corote”, a mais pesada do álbum.
Não ache estranho se o grupo lembrar os natalenses do Far from Alaska. Há, no peso do trabalho de ambas as bandas, elementos que os aproximam – e demonstram o quanto a cena rock ‘n’ roll brasileira é forte, diversificada e capaz de ser muito mais que pastiche musical.
Mas o encerramento do disco da Anônimos Alhures, com “Brado Apocalíptico” e “A Maquinaria”, além do fato do grupo, diferentemente da Far from Alaska, cantar em português, espantam qualquer possibilidade de comparação, reforçando a magia da música em fornecer grupos que, por mais próximos que possam ser, mantém identidades próprias. Ganha o rock, ganhamos nós.
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