Do alto de seus 22 anos, Pabllo Vittar já é uma personagem marcante na história da música pop brasileira. Para um país em que a intolerância é marca registrada – somos o que mais mata travestis e transexuais e em que os números de violência contra LGBTs crescem assustadoramente –, a simples existência da cantora drag é um ato político e de resistência.
Nascida em São Luís do Maranhão, Pabllo montou-se pela primeira vez aos 17 anos, e foi na mãe que encontrou apoio para enfrentar os desafios que a vida em um país homofóbico impõem. Sua carreia na música foi algo meteórica. No final de 2015, gravou e lançou na internet de maneira independente a música “Open Bar”. Foi o início da formação de um fã-clube e de seguidores de seu trabalho, ainda que os haters também tenham surgido no mesmo momento.
Para alguém que teve um prato de sopa quente jogado na cara quando era jovem, pois o garoto que fez isso achava que ela precisava “agir como um homem, falar com voz de homem, ser homem”, as críticas à sua voz e ao fato de ser afeminado (o que ela diz ser uma espécie de ato revolucionário) são coisas a serem tiradas de letra. E há uma força essencial que vem do público e é refletida pela existência de Pabllo. Muitos jovens encontraram nela a força para se aceitaram e amarem.
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Em entrevista à revista Trip, concedida no último mês de fevereiro, a cantora falou sobre ser um modelo para essas pessoas. “A gente tem que apoiar mesmo e levantar essa bandeira. Se hoje estou dando uma entrevista montada de drag, é porque muita gente morreu e sofreu preconceito para que eu ocupasse esse espaço”. Literalmente, é a certeza de que a música tem a capacidade de empoderar as pessoas, como têm mostrado as mulheres trans Assucena Assucena e Raquel Virgínia, da banda As Bahias e a Cozinha Mineira, além de Liniker, MC Linn da Quebrada e Rico Dalasam, outros nomes marcantes dessa cena de enfrentamento ao discurso de ódio.
Ainda que muitos possam conhecê-la pela participação na banda do programa Amor & Sexo, da Rede Globo, ou ainda do clipe de “Insight”, da cantora Luiza Possi, é, também, por Vai Passar Mal, seu primeiro disco completo, lançado em janeiro deste ano, que ela quer (e deve) ser reconhecida.
https://www.youtube.com/watch?v=HT1LTv5FHTY
O álbum chegou arrasando. Com apenas uma semana após seu lançamento, Vai Passar Mal era o terceiro disco mais baixado no iTunes.
O álbum chegou arrasando. Com apenas uma semana após seu lançamento, Vai Passar Mal era o terceiro disco mais baixado no iTunes; 9 das 10 faixas que compõem o registro constavam da lista de 50 mais tocadas no Spotify. O sucesso é resultado da entrega de Pabllo ao pop romântico, que traz misturas de samba, trap, tecnobrega, forró, funk carioca, música eletrônica e MPB. A cereja do bolo foi a estratégia de colaborar com vários produtores, como Brabo, Mafalda e Diplo, o DJ membro da Major Lazer e Jack Ü.
Pabllo transita com desenvoltura por essa fusão de gêneros e ritmos. Não se trata de uma tentativa de ser a “Beyoncé brasileira”, como alguns críticos apontaram. Ela usa de forma inteligente a cadência que cada uma de suas canções possui, e fala de sofrência até vadiagem, ressignificando o termo ao tornar o “ser vadia” uma maneira de ser você, sem amarras ou máscaras.
Há uma convergência entre Vai Passar Mal e trabalhos recentes do pop nacional. Mas um ponto é determinante em diferenciar o que a drag faz das canções de, por exemplo, Anitta e Ludmilla e que lhe confere autenticidade: o que Pabllo Vittar canta está em consonância com a imagem que temos dela, logo, cada faixa do disco grita e reflete a cantora.
No fim, Pabllo Vittar faz, talvez até sem dar-se conta disso, um disco de protesto sem evocar nenhuma sentença neste sentido. O ato revolucionário a que ela se refere em entrevistas, é estar viva e cantar sobre seu universo. O cotidiano ímpar que reside (e resiste) em cada partícula de seu DNA.
NO RADAR | Pabllo Vittar
Onde: São Luís, Maranhão.
Quando: 2015.
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