Ouvir a Tuyo exige que o ouvinte faça força em dissociar o trabalho do trio curitibano do que faziam com a Simonami. Não chega a ser um trabalho fácil, pois o próprio grupo não trata de simplificar as coisas. O primeiro EP do trio, Pra Doer, carrega a mesma melancolia agridoce que marcou a carreira dos três músicos.
O álbum guardaria poucas surpresas não fosse seu início, desconectado da trajetória dos artistas, jogando uma sonoridade moderna que cria um contraste necessário – à obra e ao conjunto. “Conselho do Bom Senso” leva o público de volta aos anos 80, resgatando nuances do trabalho de Marina Lima, e o puxa novamente à contemporaneidade num flerte com a obra da carioca Mahmundi.
[highlight color=”yellow”]O trabalho das irmãs Soares, Lilian e Layane, é sempre muito seguro.[/highlight] Já na Simonami elas mostravam uma capacidade ímpar de casar suas vozes de forma harmônica, sutil e aveludada, uma doçura que dava à melancolia de suas canções um contraponto curioso. Como intérpretes, a experiência na edição 2016 do The Voice Brasil deu novos contornos ao que já conhecíamos da dupla. Em Pra Doer, elas mantém a personalidade sonora e estética, que abraça tonalidades de arte naïf, mas procuram fazer isso da forma mais autoral possível.
Em Pra Doer, elas mantém a personalidade sonora e estética, que abraça tonalidades de arte naïf, mas procuram fazer isso da forma mais autoral possível.
“Candura”, “Solamento” e “Amadurece e Apodrece” são a essência desse universo íntimo e, por vezes, introspectivo das irmãs e de Jean. É possível encontrar ecos das propostas de pop como de Lana Del Rey, ou do folk de Julie Byrne. A Tuyo parece imersa neste mundo em que cantam – é agradável acompanhar como as composições parecem exalar as melodias, o que amplifica essa atmosfera única e íntima que resulta da audição do EP.
Há, é verdade, pouca novidade olhando em perspectiva, mas é impossível negar que essa elegância sonora e lírica, cheia de significados e detalhes, não encante o suficiente através da poesia desmedida (e até dolorosa) do grupo, que [highlight color=”yellow”]tem a sorte de ser representada pelo bálsamo que é a união dos timbres das irmãs Soares[/highlight].
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As irmãs, juntamente com Jean Machado, entregam um trabalho delicado, que procura moldar o cancioneiro tradicional com notas de um certo desalento, mas que em conjunto evocam uma narrativa calorosa. Característica sempre presente nas composições em que o trio está envolvido, a atemporalidade é cuidadosamente arquitetada, e ganha peso neste canto cálido, quase sussurrado, que deixa uma imperturbável sensação de pertencimento.
A Tuyo mostra com seu disco que é possível, sim, trilhar o caminho da MPB neo-indie sem soar blasé, sem transparecer-se desinteressado ou precisar recorrer à efemeridade, criando um tipo de música emocionante, encantadora, de uma maneira até meio pastoral, mas que tem alma, algo essencial à música. Hoje e sempre.