Sabe essa recente onda de chamar todo álbum de “bíblia do pop”? Certamente Rumours merece essa alcunha. Faixas como “Dreams”, “Go Your Own Way” e “The Chain” podem ser facilmente citadas como versículos bíblicos: “Players only love you when they’re playing”, Stevie Nicks, Capítulo 2 Versículo 4.
Rumours foi lançado em 4 de fevereiro de 1977, numa época em que ainda nem se falava tanto em pop como um gênero per si, por isso o disco do Fleetwood Mac é visto fundamentalmente como um álbum de rock, naquilo que na época se chamava soft-rock. Porém, é só fazermos uma análise rápida e se verá as inúmeras interposições de gêneros feitas pela banda dentro do disco, que vão da música celta ao free jazz. 40 anos depois, ainda é surpreendente olhar para essa obra e ver a sua complexidade, bem como todo o histórico que ela traz consigo.
Vamos a um resumo básico do cenário em que Rumours surgiu: a formação na época era Lindsey Buckingham (vocalista e guitarrista), Stevie Nicks (vocalista), Mick Fleetwood (baterista), John McVie (baixista) e Christine McVie (tecladista e vocalista). Entre os cinco integrantes, se formavam dois casais: John e Christine, que estavam casados há 8 anos, e Lindsey e Stevie, que haviam se juntado à banda em 1974.
Durante as gravações, o casamento de John e Christine desmoronou e eles estavam nos trâmites do divórcio, sendo que eles mal trocavam palavras nessa época. O máximo que faziam era dialogar sobre processos trabalhistas dentro da banda, nada mais que isso. Já Lindsey e Stevie estavam no momento mais conturbado de seu relacionamento e brigavam quase todos os dias, mesmo em meio às gravações. Aí você pensa: quem ficava no meio disso tudo, lidando com os casais, era o Mick Fleetwood, não é? Mas nessa mesma época Mick descobriu que sua esposa, com quem teve dois filhos, estava tendo um caso com o melhor amigo dele.
Feito o cenário romântico, inclua aí muita grana (o álbum Fleetwood Mac tinha feito grande sucesso comercial em 1975 e a banda entrou em estúdio com as expectativas da gravadora lá em cima), muita cocaína e sessões de gravações intermináveis, entrando madrugada adentro. Imagina a treta: casais separados ou no calor das brigas, incluindo aí novas relações que foram surgindo. Por exemplo: Christine já estava namorando o iluminador dos shows da banda na época das gravações. Nesse cenário, é de se imaginar a dor com que Stevie Nicks canta, em “Gold Woman Dust”, faixa que encerra o disco: “pickup the pieces and go home”.
Stevie Nicks já declarou que a banda criou seu melhor trabalho enquanto seus membros estavam no seu pior momento.
A própria Stevie Nicks já declarou que a banda criou seu melhor trabalho enquanto seus membros estavam no seu pior momento. Porém, o mais importante de Rumours é que você pode não saber de nada dessa história e ignorar as tempestuosas relações por trás das faixas, mas tudo aquilo que é cantado ainda fará muito sentido, ainda soará verdadeiro e acessível.
De caráter extremamente pop, cercado por uma instrumentação complexa e pelo jogo de vozes entre os vocalistas, o Fleetwood Mac tomou para si um caráter quase sobrenatural, de trazer essa energia meio celta para um universo de composições íntimas e intensas.
Depois de 40 anos, Rumours segue sendo um álbum tão intenso, que quando as pessoas o descobrem elas não passam imunes a toda essa energia contida nesses 40 minutos. O melhor exemplo disso é que, em 2011, a série Glee fez uma homenagem ao disco, o que fez com que o Fleetwood Mac voltasse aos charts, aparecendo na 12ª posição da Billboard 200.
A música pop, bem como o rock, segue se influenciando por esse disco de forma básica: de Tori Amos a Florence and the Machine, de The Cranberries a Taylor Swift. Rumours é a representação mais forte do sentido de transformar a sua vida, a complexidade dos seus sentimentos em um legado artístico realmente forte e que faz sentido para um sem-número de pessoas. Aproveite esse momento para escutar essa obra-prima de novo e de novo e de novo.
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