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A Satyrianas, o famoso festival d’Os Satyros, em risco

porBruno Zambelli
19 de outubro de 2017
em Teatro
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Lembro-me exatamente da primeira vez que pisei em São Paulo. Eu não passava de um garoto do interior que tinha pela frente uma cidade como jamais havia visto. Caía, e pode parecer mentira o clichê, uma garoa fina enquanto eu caminhava pelo centro. Os velhos casarões, os casebres, os cortiços, os prédios históricos, pessoas passando aos montes; tudo era lindo naquela terra de todos que, de alguma maneira, passava a ser um pouco minha também daquele dia em diante. Sampa, como dizem os moderninhos, é mesmo de todos e justamente por isso acaba sendo de ninguém. É uma metrópole única, de alma livre e selvagem.

Por ali, tudo passa e o faz de maneira frenética, como também é frenético o vai e vem dos incansáveis paulistanos pelas ruas. Eu me debatia sozinho no mar de gente de “éssepê” e mirava o horizonte com os olhos perdidos e encantados. Procurava um norte? Creio que não, me deixava levar pelos sentidos, por todos os lados, perdido na imensidão de São Paulo. Era impossível, e eis aí mais um clichê, não cantarolar mentalmente a famosa música de Caetano enquanto passeava pelos pingos da cidade. Até aquele momento, eu desconhecia a força da grana que ergue e destrói coisas belas, pulsão da Paulicéia, e pensava apenas no meu coração que pela primeira vez sentia aquela coisa que havia tomado de assalto o peito de meu compositor favorito anos antes.

Àquela altura, a cidade não era apenas prédios e vias, mas também o reduto da possibilidade e do delírio. Era a São Paulo de tantos encantos e santos, de tantos gênios que nela, e por ela, produziram pólvora para estraçalhar e reinventar a cultura nacional. Era a São Paulo que eu, como tantos, idealizava. E talvez ainda hoje idealize, confesso. Que São Paulo é sempre isso: paixão e desespero.

Mas quem, afinal, é São Paulo? Difícil de responder, sobram pistas. São Paulo é garoa, poeira, caos e trânsito. É lanche de mortadela, bolo do Bixiga, pernil do Estadão e tradicional do Ângelo. São Paulo é comoção de vidas e é também desesperança. [highlight color=”yellow”]São Paulo é a terra do teatro[/highlight] e, acima de tudo, é mutável. Essa cidade nunca é, sempre está, e está sempre aquilo o que fazemos dela. Hoje, a pobre São Paulo é um bocado mais triste. É sufoco e afobo como sempre mas é também ração pra indigente, farinata na merenda, artista prestando esclarecimento e museu correndo riscos. É polícia assassina, é desocupação, é demolição com gente dentro e prefeito ostentação. São Paulo sofre não só da falta de amor, como diz uma outra canção, mas também da falta de consciência e de memória. A maior cidade do país caminha a passos largos para o seu próprio funeral. Está abatida, vitimada pela barbárie e pela ignorância. Restam poucos respiros a essa bela agonizante atualmente, e a cassada contra eles é tremenda. Querem a todo custo sufocar a pobre dama, e nesse ano de 2017 arrancaram-lhe um sopro de vida e tanto: as Satyrianas.

Para os que desconhecem a Satyrianas, Festival organizado pela Companhia Os Satyros, [highlight color=”yellow”]falamos do maior festival de artes do país.[/highlight] Algo único e gigantesco, impressionante e deslumbrante. Falamos de mais de 70 horas ininterruptas de teatro, música, cinema, dança, circo e sarau. Mais de 70 horas de uma cidade respirando arte. É difícil falar em algo parecido no mundo. Desfilam pela Praça Roosevelt nesses dias todos os grandes nomes das artes no país, muitos deles apenas como expectadores desse rito paulistano. São diversas atrações, todas concorridíssimas e no esquema do “pague o quanto puder”.

O evento tem uma média de 600 apresentações por edição e transforma o centro da cidade, uma das áreas mais degradadas da capital, em morada das artes, da tolerância e do amor. Quem não se lembra, por exemplo, da edição passada toda dedicada à atriz Phedra D. Córdoba? Quem não se lembra de José Celso chegando à praça em uma carruagem na época d’Os Sertões? Todo mundo! Todo habitante dessa terra inóspita e apaixonante tem ao menos um causo pra contar acontecido no famoso Festival. E esse Festival, que nos possibilita tantas boas histórias, corre o risco de virar ele mesmo apenas mais uma história nessa cidade que luta tanto pra dormir mas que tem cada vez mais se esquecido de sonhar.

Uma portaria, publicada em fevereiro pela Prefeitura de São Paulo, veda a realização de eventos e a concentração e dispersão de blocos carnavalescos na praça.

O motivo desse disparate? Uma portaria, publicada em fevereiro pela Prefeitura de São Paulo, veda a realização de eventos e a concentração e dispersão de blocos carnavalescos na praça, o que, evidentemente, é um absurdo, já que a Praça Roosevelt é teatro, carnaval, chegada e saída de tudo e todos. A praça é via de acesso ao desconhecido e, entendam, é morada do povo. Ao menos era. A Prefeitura, que vem correndo na contramão do mundo quando defende os carros em detrimento das vidas e dos prédios em vez dos habitantes, justifica o troço alegando que a portaria atende reclamação de moradores da praça e de seu entorno. São aqueles de sempre, que munidos de seu carnê de IPTU e de toda estupidez do mundo exigem uma cidade quieta e sem vida: uma vista morta para as sacadas gourmets de seus edifícios impenetráveis.

O Festival acontecerá de 02 a 05 de novembro e ficará restrito aos teatros do entorno da Roosevelt e alguns outros espaços com os quais foram criadas parcerias. Além disso, a tal portaria estabelece um horário limite: [highlight color=”yellow”]toda atividade deve ser encerrada pontualmente à 1h da madrugada[/highlight]. A limitação no horário impossibilita a programação ininterrupta de arte pelo ventre central da cidade, isso quer dizer que a Satyrianas como a conhecemos, e adoramos, será apenas saudade se nada for feito. A adequação à portaria deforma completamente o formato e o ideal do Festival transformando a Satyrianas, que sempre foi um furacão, em uma brisa leve e passageira. Apesar disso, a edição desse ano já conta com 400 atrações e a tendência é que a coisa cresça com a repercussão do imbróglio.

A Prefeitura e os tais moradores se esquecem de muita coisa quando cospem na face dos artistas. Esquecem, por exemplo, que se não fossem os teatros que se estabeleceram na praça o lugar ainda estaria sucateado pelo crack e pela miséria. Esquecem que Os Satyros [highlight color=”yellow”]lutam há décadas para transformar a Roosevelt através do afeto, da força do teatro e do amor.[/highlight] Esquecem, por fim, que uma cidade sem alma não passa de um amontoado de cimento e que assassinar as Satyrianas é matar também o próprio centro.

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Leia também
» Após portaria da prefeitura, Satyrianas deixa de ocupar praça Roosevelt pela 1ª vez em 18 anos
» A silenciosa ofensiva do terror

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Arrancam um pedaço precioso de uma cidade possível. Uma cidade que víamos surgir no horizonte, mas que desde o início da administração Dória vem desaparecendo gradualmente, dando novamente espaço aos carros e às cercas elétricas dos condomínios de auto padrão. Lutar pela Satyrianas é dever de todo artista e de todo brasileiro, esteja onde estiver. Não podemos admitir o massacre dessa preciosidade, não podemos permitir que o prefeito e seus asseclas continuem a pulverizar a beleza e a poesia da cidade. Não podemos admitir que tudo seja empreendedorismo na terra do governante das selfies. [highlight color=”yellow”]Nós ainda creditamos na poesia e lutaremos por ela, custe o que custar.[/highlight]

Mas São Paulo também é resistência. Mesmo em agonia a cidade vibra. É certo que o medo cega e paralisa, mas é possível vencê-lo através da alegria e da liberdade, infinitamente mais contagiantes. Os moradores de São Paulo, principalmente os do entorno da praça, precisam descer de seus pedestais azulejados e encontrar os artistas nas ruas. Precisam compreender que a vida noturna é imprescindível às entranhas de qualquer vila e que é preciso se entregar às esquinas vez ou outra para que possamos compreender nossa aldeia.

Que futuro queremos para as nossas cidades? Que sejam meras passarelas sem vida por onde passeiam conversíveis e fantasmas em direção aos escritórios? Cidades esterilizadas onde ninguém se encontra e o outro é apenas um obstáculo entre o trabalho e a cama? Creio que não. Podemos viver em uma cidade em chamas, onde artistas em combustão flanam pelas ruas incendiando a alma dessa população gelada. Podemos viver a fantasia, partilhar o sonho e construir uma nova cidade através do prazer e não de proibições. Ao invés de uma vida plastificada pelo consumo desenfreado e pela aparência, uma vida repleta de poesia, onde um prédio nunca valerá o mesmo que uma multidão apaixonada.

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Tags: João Doriaos SatyrosPraça RooseveltPrefeitura de São PauloSão PauloSatyrianas

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